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sábado, 16 de julho de 2016

Companhia de ballet. Maria Emília Clarck






 Esta matéria foi publicada em Campus/ O Dia



 


Maria Emília Clark

Bailarina profissional, professora, coreógrafa, assistente social  (UFAL), pós-graduada em Metodologia do Ensino das Artes Cênicas (UNINTER). Integrante da Companhia Ballet Stagium (década de 90).


DOIS DEDOS DE PROSA 

Maria Emília Clark é uma artista e trabalhadora das artes em Alagoas, bailarina profissional que vem atuando de forma intensa e altamente qualificada no campo do ballet em nosso Estado.  Na oportunidade em que traz mais um de seus espetáculos, é natural que se preste uma homenagem à artista e à excepcional figura humana que tanto nos honra.
Maria é uma pessoa definitivamente empenhada em um processo criativo de larga influência e qualidade em nossa vida cultural. Campus/O Dia agradece sua atenção ao deixar este registro conosco, sem dúvida uma importante contribuição para a história da arte em Alagoas.
Tenha uma boa leitura
Sávio de Almeida


Atitude: eis a palavra

Maria Emília Clark

 I – A  razão de um caminho

Eis a palavra em que neste momento penso a dança através da minha trajetória com o ballet clássico e com projetos coreográficos que buscam a transversalidade das artes.  Vivo uma continua investigação do processo pedagógico desenvolvido no Ballet Maria Emília Clark, no qual acredito, que une a formação acadêmica do bailarino profissional com ações práticas, coreográficas, intuitivas, trabalhando o universo da criança a partir dos 3 anos de idade, através do método da socialização do movimento com fortalecimento da autoestima, gerando atitudes em vias de transformação pessoal e social em evolução.
Esta é ua atitude ressignificante, definindo a arte do ballet, como linguagem do conhecimento, que pode ser um meio de preparar cidadãos que, emancipados cognitivamente, são capazes de fazer escolhas fiéis, onde suas reflexões, traduzidas, de forma responsável do ponto de vista de apropriação de base histórica, com conteúdo informativo, através das ações diárias, pelas vivências artísticas, defendo que os seres humanos sensibilizados, experimentam a possibilidade de se entenderem e se perceberem de forma consciente e prazerosa, modificando o seu dia a dia. Nos processos criativos históricos, temos como base em nosso projeto pedagógico a criança e a sua formação com Ballet Clássico (Métodos estudados ao longo dos anos como: Vaganova, Barre-à-Terre e outros existentes nos maestros presentes na história brasileira da arte do Ballet Clássico).
A nossa  base acadêmica foi fortalecida pela interligação de nossa condição de  Assistente Social (UFAL) e bailarina do Ballet Stagium, que abriu portas para tudo que hoje se faz com a nossa profissão, Cia. na qual me construí como bailarina profissional e  por mais de uma década tive a vivência dos grandes Festivais nacionais e internacionais como: Bienal de Lyon (França), Festival de Cadiz (Espanha), Festival de L’Áquila (Itália), Acordanse (Suiça), Vevey Lausanne, Festival de Havana (Cuba), Festival de Guanajuato (México) e outros como na Argentina, Uruguai e Hungria.
No ano de 1999, retornei a Maceió como coordenadora de dança do Teatro Deodoro, antiga FUNTED (Fundação Teatro Deodoro); encontrei uma cidade com limites claros, vale lembrar a ausência do Teatro Deodoro, fechado para reforma por 10 anos, com as escolas resistindo a esta situação, com esforços, mas limites claros em suas produções e processos criativos, Era final dos anos 90 e duas escolas fecharam suas portas.
A contribuição que foi dada ao nosso meio vai além da formação profissional no nível técnico de aula ( compatível ao meu, vivenciado com práxis e possibilidades, trouxemos as palavras “Projeto Social Voluntário”, que hoje eu definiria como opção de vida ) pois abrimos as portas para muitos bailarinos: mais de 350 rapazes passaram por nossas escolas, nunca se viu tantos homens dançando, com uma alta evolução técnica, em giros, saltos, técnica de Pas de Deux, com estruturas coreográficas amplas, requintadas, com um enredo e uma concepção de expressividade ressignificante, vale frisar o excelente nível técnico que deve perpassar a palavra Cia., uma outra contribuição valorosa, foi a utilização de elementos cênicos diversos e a forma inspiradora de tratar o espaço cênico via jogos cênicos, usufruindo das possibilidades dos elásticos, das rodas, dos quadros, dos andaimes, das portas, das pinturas, das esculturas, partindo para reutilização de peças de demolição, de obras de artes alagoanas, água, grama, tapetes, latas, lacres, palha, cestos, infinitas possibilidades de material alternativo.
Iniciei com os figurinos de palha, intensificando a criatividade artesanal no estado, bordados, pontos e texturas diversas, ampliei o terreno da sonoridade, buscando mixagens amplas, sonoridades diversas, o som das nossas raízes e o silêncio profundo, isto resultou em 33 projetos coreográficos, a metade para a escola e a outra para a Cia Maria Emília Clarck.
Minha vida pode ser definida por 3 ciclos, o primeiro inicia no ano de 1968, no dia 19 de janeiro, tendo os meus pais, Lydio Peixoto de Carvalho e Eva Marta Clark de Carvalho, nascida em Maceió, mas até os 11 anos morei na bela histórica cidade de Penedo, cidade na qual residiam os meus avós paternos, Lydio Araújo de Carvalho e Ester Peixoto de Carvalho, observando o homem folk, participando de todas as atividades artísticas do Colégio Imaculada Conceição, declamando, interpretando, e dançando a alegria e a história do nosso povo.
No ano de 1978, nos meus 11 anos de idade, passei a minha maior provação até então, a quase perda de nosso pai por conta de um infarto no miocárdio, nos seus 44 anos de idade, e que nos fez mudar definitivamente para a cidade de Maceió, desfazendo a estruturação de uma vida e todo o nosso contexto de vida, modificado a partir daquela data.
Em Maceió, passei a residir no bairro do Farol, estudei no colégio Sagrada Família, com bolsa de estudo, eu, Lídiva Yvette Clark de Carvalho (irmã mais velha) e Marta Clark de Carvalho (a mais nova). Na Avenida Rotary, vivenciei 10 anos, até o final de 1988, ano que conclui o meu curso de Serviço Social, pela UFAL (Universidade Federal de Alagoas), estudei inglês no Lincoln Center, iniciei meus estudos de ballet na escola Eliana Cavalcanti, com o professor Fernando Ribeiro, e, no ano seguinte, com esta diretora, tive na minha vida a primeira carteira assinada,  (1986) como professora; passei por diversos cursos de aperfeiçoamento. Ingressei no final de 1988 na Cia. Ballet Stagium e este foi o ciclo mais valioso da minha formação, que compreendeu de 1988 a 1998, data de retorno para a cidade de Maceió, residindo todos os anos 90 na cidade de São Paulo, eixo da minha profissionalização, fase decisiva para a minha vida como um todo e com intercâmbio profissional por todo o Brasil, a América Latina e  Europa.

II - Generosidade: eis o caminho

Em 1661, Luís XIV criou a academia real da música e dança,na França,  que tinha como objetivo profissionalizar a dança, determinando reformulações técnicas e estéticas para a arte, envolvendo os pés com sapatilhas de cetim, escondendo a superfície do corpo e sua força de trabalho, a dança moderna veio se preocupar com a expressividade dos gestos, desnudando corpos, assegurando o contato com a terra, carregada de energia e vitalidade, a Pós-modernidade, trouxe a ideia de aliar a dança a outras formas de arte e novas estruturas que permitissem a exploração dos limites, sair dos teatros para novos e provocativos lugares envolvendo o cotidiano das pessoas, até mesmo paredes e tetos de edifícios, a dança contemporânea, não irá se basear em técnicas e possibilitará a qualquer corpo dançar, e  tendo como premissa a pesquisa e a investigação, construindo o movimento de dentro para fora e não separando o corpo da mente. Assim como os estilos, as coreografias também evoluíram, dentro de um atual conceito, as experiências coreográficas precisam hoje ser generosas.
Desde o ano de 1999 que venho envolvida neste processo evolutivo de informações capturadas por uma formação intensa e fervorosa junto ao Ballet Stagium (SP), repensando a dança e internamente construindo uma esfera de liberdade e solidariedade.
Dentro das atividades da criação, a mais importante para a socialização do movimento, a partilha do “pão”, cada um com seu momento e todos no momento de cada um, um aprendendo com o outro. A possibilidade de se sentir pertencente a um grupo, de forma ativa e criativa, traz grande satisfação para o indivíduo ampliando seu campo de ação e o seu potencial criativo tanto no teatro, como na dança, quanto no seu cotidiano. Neste início de processo da dança criativa, a coreografia, concentrei-me no processo de ação, ao invés de direcionar as ações para as consequências das práticas, sem preocupação sobre resultados.
Aprendi a ser generosa com os meus pais, com o cotidiano dos meus amigos na minha infância e carrego essa característica no meu processo coreográfico coletivo. Dei continuidade com o meu curso de Serviço Social (UFAL) e na minha profissão de bailarina, professora e coreógrafa, tive a influência de nomes como Ademar Guerra, que me ensinou a ser verdadeira e observar a dança como se observa os atos do cotidiano, com a Márika Gidali, a efetiva forma soberana de fazer  esta arte com uma prática intensa e voltada para a educação e honestidade nas ações e interpretações, não passando apenas pela teoria, mas na práxis infinita, com Décio Otero, que me conferiu a persistência e o método, com Ademar Dornelles, aprendi a olhar para o meu interior e tentar enxergar quem sou, com Fábio Villardi, a observar os caminhos da teatralidade, com Áurea Ferreira e Paula Perillo, a importância da amizade, da simplicidade e do amor a nossa arte. Com Fernando Gomes, companheiro da minha jornada, a construção de nossos enredos e vida intensa.
Na criação recebi a parceria dos registros por meio de cartas, livros e críticas em jornais do cineasta Joaquim Alves, um nosso impulsionador, dos teatrólogos Braúlio Leite Junior e Pedro Onofre, da atriz Anilda Leão, do memorialista Romeu de Mello Loureiro, dos professores Antônio Lopes, Fernando Ribeiro e Reginaldo Oliveira, das coreógrafas Eliana Cavalcanti, Telma César e Isabelle Rocha, da arquiteta Mirna Porto Maia, Cássia Navas, Helena Katz, Eliana Caminada, Flávio Sampaio traduzindo na ampliação do estudo do movimento e do seu consequente resultado em práticas corporais conscientes, criativas e transformadoras são objetivos que desafiam a todos que queiram desenvolver um trabalho artístico que tenha comunicação com o seu objetivo principal.
Este processo indicará uma opção onde todos o envolvidos continuarão preparando cidadãos que participem da realidade social de forma mais criativa, crítica e construtiva, embaso   na formação histórica  ampla em torno do Ballet Clássico e estudos coreográficos com foco na  generosidade das linguagens cênicas do teatro da dança, da música como áreas específicas autônomas do conhecimento.
O inconsciente coletivo do tipo humano do alagoano está recebendo ainda as informações das antigas casas de vivendas que faziam apresentações rotineiras do coco de roda, ao sabor de canções populares e que chegaram aos nossos dias, foram modificadas e entraram no nosso cotidiano e maliciosamente se faz esquecida, desta forma devemos através desta citação acrescentar de forma igualitária a qualquer caminho da dança, o nosso Folclore, as nossas danças tradicionais locais e todo o universo cultural das terras alagoanas.
Diante desta reflexão, iniciei no ano de 1999, o primeiro trabalho em ballet voltado a coletividade e a diversidade, que resultou na primeira obra coreográfica, que pela sua autodeterminação “Nigrum”, clamou a marca maior de nossa ancestralidade, que reuniu alunos deste trabalho social, iniciado na FUNTED (Fundação Teatro Deodoro), em parceria com as minhas expectativas e filosofia de vida, neste trabalho a estruturação de um ambiente propício e finalidades supremas, vinculado ao homem, história e divindades.
A evolução coreográfica deste momento, denotou compromisso da formação do bailarino clássico, atrelado a um projeto coreográfico amplo, comprometido, trazendo ações reflexivas através da utilização de diversos elementos cênicos, como cordas, como utilização de elementos da natureza (água, terra, fogo), reunião de atividades circenses (voos, suspensão, pernas de pau), como também a palha, om figurinos feitos a partir do tema da reutilização de materiais (como tampas e lacres de latas), aparecimento de estruturas móveis, que circularam e propuseram um novo painel profissional cênico no ballet alagoano.
Referências estas que influenciariam toda a década dos anos 2000, influenciando as companhias locais e colaborando decisivamente para um repensar coreográfico, ativo e atual.
Iniciei um processo criativo, que não pararia jamais. Diversos momentos foram criados ao longo do período (1999 a 2016), completando neste ano a  trigésima terceira obra coreográfica voltada a nossa história e vida, para Alagoas,  Brasil e mundo.
Citando o exemplo o estimado Ib Gato Falcão, traduzimos em um Processo Criativo que seria nominado:  Grandis
Posso citar também outra obra coreográfica do ano de 2008, que pontificaria 4uatro(04), representantes do Teatro Alagoano ( Bráulio Leite Jr, Venúzia de Barros, Selma Britto e Anilda Leão). No período de 2014 a 2015, trabalhei a história da urbanidade e mobilidade alagoana, uma pesquisa histórica baseada nesta evolução, introduzindo o meio de transporte da bicicleta, como a forma não poluente de acesso e reflexões diversas sobre o processo educativo no trânsito. Num segundo momento, entramos na história da nossa moda, tendo como contextualizada a Arquiteta e Designer Mirna Porto Maia, que possui uma trajetória de beleza, atitude, criatividade e cidadania, amplamente difundida no estado.  Abordei por meio da evolução dos costumes a história de nossa cultura, valorizando e reconhecendo o trabalho dos artesãos, dos estilistas, provocando debates, estimulando a criatividade e traduzindo em memória, para questionamentos e reflexões desta moda produtiva, provocando uma investigação, reunindo conceitos de arte e de história, uma visão criativa, social, objetivado pela imaginação do espetáculo Croquis das Princesas
Vale lembrar que no ano de 2005, foi concebido o significativo trabalho sobre este tema, cujo o fio de ligação foram os diversos pontos do artesanato alagoano, tendo como a matriz principal , o Ponto Singeleza e a vida de D. Marinita, sempre propondo uma reflexão memorialista sobre os nossos criadores e criaturas que  foi intitulado: Mãos.
No ano de 2011, tivemos a experiência, com os nossos manguezais alagoanos, denominado Evergreen (sempre-vivos), uma grita contra a destruição dos nossos manguezais e sobre a invasão territorial deste ecossistema. No segundo semestre deste ano, apresentei uma especial reflexão sobre a cultura popular alagoana, onde o viés era que o artista popular faz sua arte com o que tem a seu alcance, criando das sobras de seu cotidiano um mundo novo, que é o mundo da sua gente, do seu povo, da sua história. Sob o prisma de suas fantasias pessoais, as que não cabem na rotina formal ou funcional de seu dia-a-dia, sem nenhum Intuito exótico, mas a arte enraizando o Humus Cultural do seu território. O espetáculo percorreu a trajetória da colecionadora e artista naif Tânia Pedrosa, referendando os artistas populares dos municípios alagoanos, a exemplo de Fernando Rodrigues da Ilha do Ferro e outros que compõem o acervo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN.
Entre inúmeros processos criativos e significativos ao longo destes 17 anos de existência do Ballet Maria Emília Clark, com uma ampla reunião de homens marcantes em seu tempo e que se eternizaram ou se eternizam através de suas árvores reflexivas, criativas, musicais, teatrais, seus escritos sejam pelo meio físico ou por sobre diversas obras de arte, chamando Graciliano Ramos (Torta de Maça a Vidas Secas, ano 2013), distribuindo Djavan ( Místico Clã de Sereia, ano 2010), pintando a visualidade de Pierre Chalita (Chalita, ano 2007),  colorindo a diversidade de Delson Uchoa (Tanz,ano 2006), trazendo as Confissões de um Poeta (Lêdo Ivo,ano 2003),  colhendo as flores da pintura e da escultura de Eva Lecampion ( O Importante e´a Rosa, ano 2014),  coreografando versos de Arriete Vilela,  Solange Chalita e  Paulo Caldas( O Primeiro Voo do Pássaro,ano 2013),  indicando a seca do Rio São Francisco( Opara,ano 2006) e  entre tantos outros processos criativos , cheguei no ano de 2016, com uma vasta pesquisa sobre o nosso estado.
Neste ano, no contexto das comemorações dos 200 anos do Estado de Alagoas (1817-2017), a Cia Maria Emília Clark, evoca a trajetória do escritor, historiador, jurista, músico e poeta, Jayme de Altavila (Anfilófio Jayme de Altavila Melo/1895-1970).
A Cia. Maria Emília Clark, realizará no Teatro Deodoro, no dia 14 de julho de 2016 o seu novo espetáculo, que traduz os 17 anos da Cia, com o seu décimo sétimo trabalho memorialista, onde conduz a formação do bailarino clássico aliado ao projeto coreográfico em torno da transversalidade das artes. Este momento se realizará por conta da parceira do Ballet Maria Emília Clark, da DITEAL (Diretoria de Teatros Alagoanos) e do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGAL), dentro do momento histórico que reflete o Maceió 200 anos.
Este ano iniciamos um projeto de pesquisa iniciado no ano de 2014 e que resultará numa trilogia (Alagoas 200 anos). A primeira parte será apresentada no próximo 14 de julho de 2016 em teatro Deodoro, às 19:30h onde a reflexão será a continuidade das atitudes memorialistas e o reconhecimento dos homens de bem.


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