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quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Crônica Diária (24/001/2019).A Rua da Penha, costureiras, modistas e a leitura M. Deli




A Rua da Penha, costureiras, modistas e a leitura M. Deli

Luiz Sávio de Almeida


              Naquele meu tempo,  a costura era algo importante, pois não existia esta facilidade de hoje com as confecções. Então costurar era um verbo obrigatoriamente conjugado em quase todas as casas e aquelas que podiam tinham o quarto de costura. Muita casadas eram prendadas e se entretiam na costura, mas o seu forte era bordar e, realmente, fazia coisas maravilhosas. Primeiro ela fazia o risco e o transferia para o pano, a partir de um papel carbono que ela comprava na própria  Penedo. Depois era bordar toalhas maravilhosas, com os pés ritmando o pedal da velha máquina Singer, que ainda hoje guardo com cuidado. Foi comprada quando ela morava em Quebrangulo, lá pelos anos trinta. Ela colocava o vestido preso no bastidor, pedalava e cantava. Tenho uma toalha que ela bordou para a mesa do dia de Natal. É um verdadeiro encantamento.
               Costureira ruim era a que fazia cu de pinto; costureira de primeira chegava a ser chamada de modista, era fina e somente fazia roupas importantes e de quem podia pagar mais. Era a roupa de formatura, a roupa do casamento, a das festas. Esqueço o nome dela, mas na própria Rua da Penha, no correr de cima, havia uma costureira ou modista de fama. Foi quem fez a roupa da minha irmã na formatura de ginásio de minha irmã, roupa falada lá em casa, pois era solenidade de primeira. Isso no Colégio das freiras, na entrada do Cajueiro Grande.  O tecido se comprava mesmo em Penedo e um deles, gente de família não gostava de usar pois,  curiosamente, era chamado de puta ligeira, cheio de bolinhas. A razão eu não sei, mas o puta ligeira chamava atenção.
               Minha avô Dondon na Capela, sustentou as filhas com a máquina de costura e a arte deve ter passado para as filhas, dentre ela a minha mãe que mantinha uma coleção de Jornal das Moças, onde tirava ideias para  vestidos e bordados.  Ele existiu de 1914 as 1868, mas somente lembro dele em nossa casa de Penedo. Mamãe colecionava e encadernava na casa do Seu Joãozinho, quase vizinho e que trabalhava, também em uma farmácia no comércio. Uma outra leitura de minha mãe, era uma coleção de capa verde e publicada pela Editora Nacional. Eu pegava e devolvia livros para ela, na Biblioteca que existia – se não me engano – na Ordem Terceira.  De tanto ver lá em casa, decorei o nome de um escritor chamado M. Dely, onde vidas de lords e o meloso europeu chegava ao Brasil através de Monteiro Lobato e em Penedo através de não-sei-quem.
M. Dely ficou em minha cabeça sempre em capa verde. Era o pseudônimo de dois irmãos franceses; Monteiro Lobato criou a Biblioteca das Moças e tome de M. Deli com seus amores, sofrimentos, o tipo do que poderia ser considerado um folhetim fácil. Deveria vender bem e a Biblioteca das Moças existiu por uns trinta anos. Veja-se a recorrência da palavra Moça. Jornal das Moças, Bibliotecas das ditas cujas... E era assim que seguia a vida de minha mãe: costurava, lia M. Dely, não perdia a soirée dos domingos e me dava purgante de óleo de rícino.

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