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terça-feira, 22 de janeiro de 2019

O maravilhoso das ruas que se encantam na memória. Rua da Penha em Penedo, Alagoas


O maravilhoso das ruas que se encantam na memória. Rua da Penha em Penedo, Alagoas



Luiz Sávio de Almeida




A minha geografia pessoal de Penedo tem de ser absolutamente diferente da geografia de outras pessoas, na medida em que ela existe recordando e atribuindo sentimentos e significados. Os lugares são marcos de vida e busca-los no passado, além de ser um exercício maravilhoso, é uma procura de sentido de vida. Neste entendimento desta geografia que atribui significações pessoais a lugares, a gente toma posse de um pedaço da cidade. Assim, a Rua da Penha é uma multiplicidade de situações  e de circunstâncias que somente a consegue inventar e reinventar quem a viveu de uma determinada forma e modo. Eu a vivi ainda usando tamanco de madeira, uma indicação mais distante de tempo que consigo para ela e sua intensidade localiza-se em um pequeno pedaço que vai do Gabino Besouro até o Beco da Preguiça; para cima, em direção à Praça, ela não é propriamente a minha rua, sendo rarefeita e apenas lembrada em situações particulares como almas e passarinhos. Seu limite para quem sobe    – e à direita  – é a bodega do Seu Cazuza e, pela esquerda, a imponência do Beco da Preguiça, aquela ligação com a Rosário Estreita, conforme se dizia por existir a Rosário Larga.
Este é o universo privilegiado de minha Cidade de Penedo, um quase nada dentro daquele território urbano cheio de sobrados e belissimamente repassado por Caroatá, pelo idos do último quarto do século XIX.  Por ali, existe um tempo enganchado e que é o tempo de minha infância e talvez por isto, eu jamais consiga esquece-la  e a carrego em mim; vezes ela está quieta e vezes algo a futuca e então ela volta de alguma forma. E o interessante é que as pessoas das quais me recordo, não aparecem destacadas das relações que tiveram comigo, talvez querendo indicar que são mais eu-mesmo do que elas. É como se eu as utilizasse para lembrar-me de mim e como se fosse impossível ao tempo fugir da marcação das individualidades.  Daí, a mesma rua serem muitas.
Nela, eu tenho o meu próprio patrimônio histórico e recheado, inclusive, de monumentos.  Posso dizê-los: são poucos e basta descer a rua e eles aparecem; subindo, eles não existem, salvo no que vou chamar de minha primeira Penedo.  A minha primeira Penedo foi demarcada pelo Cajueiro Grande; a Rua da Penha é a minha segunda Penedo.  Apois, o primeiro monumento histórico era a Bodega do Seu Cazuza, depois a casa da Dona América, onde morou, também, depois que Dona América ficou viúva,  Dona Virgínia e Seu Pontes, e vai que aparece a casa de Seu Joãozinho; em seguida a de uma menina  de quem não lembro o nome e a quem jamais esqueci, parecendo que a mãe era costureira e vinda da Ilha das Flores. Finalmente, a casa do pai da Dona América e a majestosa Igreja da Penha. Depois – e muito depois, depois mesmo – vinha a casa onde vi o defunto e já estamos vizinhos ao Grupo Escolar Gabino Besouro, ponto de entrada em minha Penha e menos importante do que os pontos de saída que eram a  bodega de seu Cazuza e o Beco da Preguiça.
Era uma rua poética? Posso dizer que sim; jamais a recordo sentindo algum pesar, algum peso puxando de banda e quem sabe se é exatamente por isto, que a seguro em mim como se fosse um saboroso sapoti?  Ela virou poesia e tenho a clara sensação, agora, de que as ruas são escritas, textos e como tal devem ser lidas.  Eu sempre aprendi muito com meu pai e com minha mãe; eram dois aprendizados distintos; com minha mãe eram mais dicas humanas. Uma vez eu estava com um problema sério e fui conversar com ela. Depois de me ouvir, veio a sugestão: “Meu filho, talvez você precise ser feliz com o que é possível!”. Acho que a minha Rua da Penha foi uma das minhas possibilidades.


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