Atualmente esta cursando história pela Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL campus III Palmeira dos índios – AL, é membro do Grupo de Pesquisas em História Indígena de Alagoas GPHI-AL, onde desenvolve pesquisas com o grupo étnico a que pertence os Xucurus-Kariri da aldeia Fazenda Canto.
OS RICARDO: relatos de dona Maria do Amparo sobre os primeiros anos na Aldeia Indígena Fazenda Canto
Cássio Ferreira da Silva
O texto diz
respeito à família Ricardo, uma das primeiras a se estabelecerem no que hoje é conhecido
por Aldeia Indígena Fazenda Canto, demarcada no município de Palmeira dos
Índios em 1952. Como membro de tal grupo
familiar buscarei, em um primeiro momento, compreender em que circunstâncias se
encontravam os primeiros habitantes da aldeia nos anos iniciais de sua
povoação.
A cidade de Belém |
Expulso de suas terras meu povo se dispersou e as famílias buscaram abrigo nas regiões circunvizinhas de Palmeira dos Índios; a família Ricardo passou a viver em Canudos, região que hoje é ocupada pelo município de Belém, mais especificamente em área localizada às margens do rio Lunga, denominada Passagem do Vigário. Segundo as recordações de moradores mais velhos do atual município de Belém, os índios da família Ricardo tinham apenas suas ‘casinhas’ e como não tinham terra para plantar, trabalhavam nas fazendas das famílias mais ricas da região.
Esse contexto só começou a mudar em 1952, quando foi
comprada a Fazenda Canto, com dinheiro arrecadado por índios do Paraná com a
venda de madeira. Entendendo essa conjuntura, resolvi pedir para minha avó –
Maria do Amparo da Conceição – contar suas lembranças sobre o cotidiano nos anos
inicias na aldeia Fazenda Canto, e ela disse o seguinte:
Naquela época
não tinha energia, a gente usava querosene na lamparina, e quando faltava o gás
– querosene – a gente pisava a mamona
com o algodão e fazia aqueles pavio e arrodeiava num prato e tocava fogo e
queimava a noite toda[...]
A energia posso dizer que é coisa recente; foi
um padre chamado padre Ludugero que convivia aqui com os índio e eu não sei
como ele conseguiu a energia, mas primeiro era quatro poste lá naquela igreja
lá em cima; ai começou lá. Aqui não tinha água encanada, a gente usava água do
poço, barreiro e água do riacho; era a água que a gente utilizava.
Perguntei ainda sobre como era à subsistência, como
trabalhavam e conseguiam dinheiro:
Na época era
muito difícil, porque não existia trabalho; muitos viviam da agricultura,
plantava mandioca, plantava a lavoura e quando dava pra vender vendia uma
alguma parte; outros trabalhava nos vizinho, no alugado, nos branco lá fora e era assim pra sobreviver, em sítios e cercados
arrancando toco e limpando bananeira.
As casa era
tudo de taipa, não era de alvenaria né, eram casas feitas de barro e pau né, pau-a-pique, fazia aquelas casas cavava barreiro e
tapava com barro, muitas coberta de palha e outras tinha gente que fazia telha
aqui na beira do riacho e cobria, mas muitas era coberta de palha.
Ao ouvir os relatos
de minha avó sou tomado por dois sentimentos; o primeiro de felicidade por saber que mesmo
existindo um longo caminho a ser trilhado, as condições de moradia e
subsistência de meu povo melhoraram muito em relação aos primeiros anos na
aldeia, atualmente com exceção das moradias na área de retomada, todas as casas
são de alvenaria e contam com energia elétrica e água encanada; quanto à
subsistência houve uma diminuição drástica na necessidade de busca-la fora da
aldeia – trabalhando para fazendeiros, na monocultura da cana ou viajando para
São Paulo em busca de trabalho como era comum até pouco tempo atrás – isso porque
algumas políticas públicas estão sendo desenvolvidas na aldeia como, por
exemplo, o programa de aquisição de alimentos (PAA), que permite as famílias
produzirem e venderem produtos agrícolas a um preço justo.
Por outro lado fico
triste por saber que perdemos um patrimônio cultural enorme; sei que não vou
ver mais os pavios de mamona e algodão feitos para clarear a noite, também não
poderá ser visto um grupo familiar às margens do riacho cavando barro e
modelando telhas de forma artesanal para cobrir sua moradia. Ficamos apenas com
a dúvida: será que a perda cultural paga pela melhora na qualidade de vida vale
a pena?
Igreja da Fazenda Canto |
Como podemos observar
uma única entrevista nos mostrou uma imensa e rica carga de memória, que nos
permite pensar como era o cotidiano de uma etnia que passou 80 anos dispersa e
que a partir de 1952 pode voltar a se agrupar e se unificar como um povo e
permite ainda fazer comparações entre os anos inicias e o cotidiano hoje. Para
finalizar quero dizer que a coleta de memória é fundamental para não deixar se
perder a história de meu povo, para tanto será realizada entrevistas com outros
membros da família Ricardo e de outras famílias formadoras do povo
Xukuru-Kariri.
Fico emocionada em ouvir estes relatos pois,passei minha infância na Fazenda Canto, lembro-me quanto meus avos Donatila Ferreira de Queiroz e Genésio Emidio de Queiroz ,Trabalhava na lavoura e na criação de animas para nosso sustento,foram tempos de muita luta e alegrias. hoje moro em Itapevi -São Paulo , com muitos que saíram dai atrás de uma vida melhor tenho muito orgulho de onde vim. Maria Queiroz dos Santos
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