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segunda-feira, 21 de outubro de 2019
O direito penal e os empobrecidos
Este é um dos importantes documentos sobre a violência relativa à Alagoas e salvo pelo Marola
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quinta-feira, 26 de setembro de 2019
A história vinda de baixo: o folheto de feira e a seca (I)
Pequena
explicação sobre um texto provisório
Luiz Sávio de Almeida
Drought and popular literature
Este texto é uma nota escrita para ser
colocada em texto sobre a seca em Alagoas no século XIX, em continuidade ao que
fizemos com o cólera, trabalhando uma história sociológica, campo que ligamos
em grande parte à discussão encaminhada por Lucien Goldman. No fundo da
questão, existe uma relação forte entre o cólera e a seca no decorrer do século
XIX: em ambos se vive os tremores e pavores e horrores em uma sociedade
fragilizada sem possibilidade efetiva de libertar-se. O cólera fazia parte do
grande universo das epidemias, que tanto marcaram a nossa formação histórica.
Foi um inesperado para um conjunto da população que, de uma hora para outra,
viu-se em face de um poderoso inimigo, uma doença que aparecia, varejava a morte
e era diferente do que se tinha no comum das mortes.
O cólera era uma surpresa e a seca
nunca poderia ser considerada como tal, pois nunca poderia deixar de existir,
de ser atual e inerente ao modo da organização da sociedade; o cólera foi o que se poderia chamar de exótico, mas
ambos passaram pelo mesmo caminho de dores. Existiria uma história sociológica
destas dores? A resposta é afirmativa na medida em que se resguarde o modo como
a sociedade está, recebe, vive este horror.
A escrita não seria suficiente para representar a crônica destes
momentos; ela é insuficiente e, então, para que se comunique este horror, em
nosso modo de ver, ela tem que aliciar quem estará lendo convidando para soltar
a imaginação e seria com ela que se completaria a leitura e não apenas na
análise que ela estaria propondo.
Sempre fiquei me perguntando, o que havia sido produzido pela seca;
a curiosidade sobre ela se instalou, ainda menino, com a convivência com
um professor: Oto de Brito Guerra, em Natal, no Rio Grande do Norte. Era, junto
com Cascudo, um antigo integralista que repassou a posição, ficando ligado à chamada
Doutrina Social da Igreja. Foi uma pessoa de altíssima influência em minha
vida e eu estudava na biblioteca dele,
pois era amigo íntimo e colega de classe do filho dele: Marcos de Brito Guerra.
O professor especializava parte de sua biblioteca em livros sobre
seca e, vez em quando, eu pegava um e
folheava. Isto foi chamando minha atenção e, também a curiosidade que me dava a
coleção de Vingt-Un Rosado que saía
publicada em Mossoró, também no Rio Grande do Norte. Isto junto às músicas do Luiz Gonzaga foram
fazendo a seca crescer em minha cabeça e sempre estive pensando em escrever
algo sobre ela.
Daí, foram anos e anos tomando notas e sempre achei que poderia ser
um pachorrento trabalho: seria feito sem pressa e englobando alguns assuntos
sincronizados, mas, sobretudo, deveria dar prosseguimento ao que havia sido
ensaiado no texto que escrevi sobre o acontecimento cólera, com o horror
fazendo a ponte entre dois séculos: o XIX e o XX.
O livro seria Breve notícia
sobre a seca nas Alagoas e aos poucos foi tomando forma, mas ainda passará
um bom tempo em elaboração, quem sabe uns dois anos. Havia, contudo, um
capítulo que pouco sofreria alteração e tratava de uma rápda passagem sobre a
chamada literatura de cordel ou sobre os chamados folhetos de feira. Sempre
tratei um folheto de feira com o máximo respeito e sempre considerei seus
autores, pessoas que mereciam ser consultadas, especialmente, em nosso caso,
por montarem uma fala constante sobre a seca,
dando evidência e ressaltando alguns de seus elementos essenciais.
Considero que são uma fala que vem de baixo, numa forma
aproximadíssima ao que fala Thompson sobre uma history from bellow. O que eles teriam dito sobre a seca? Uma
pergunta que satisfazia outra curiosidade. Os dois primeiros textos que
publiquei na minha vida, eram folhetos de feira; um deles para a Campanha da
Fraternidade da CNBB e se chamava Voto
não se vende e consciência não se compra. Este ainda se localiza um
exemplar. O segundo foi escrito com um Compadre meu, infelizmente falecido,
chamado Chico Traíra, famoso cantador no Rio Grande do Norte: As dores do gigante ou a fachada do Brasil.
Deste nada mais tenho, nem mesmo sei o texto, embora de tanto ler vendendo
na feira, a primeira estrofe ficou gravada.
O primeiro era ligado à Arquidiocese de Natal e o segundo era para tomar
cachaça, mas eram folhetos de feira:
Desperta Brasil desperta,
Oh gigante adormecido
Verás que teu povo sofre
Escravizado e ferido
Em cada alma um soluço
Em cada peito um gemido!
Jamais procurei estruturar um livro e sempre deixei que corresse
livre, uma espécie de metodologia trabalhada pelo folheto que sabe aonde quer
chegar e chega; depois de passar por Ceca e Meca, estaremos, sem dúvida no
semiárido das Alagoas. Não esqueço da implicação de Nietsche com os livros que
são escritos para serem livros e que, aliás, Mariategui terminou por adotar. Os desvios aparentes acentuam o sentido da
direção e tudo se encaminha em espécie de carpintaria também aparentemente
caótica à objetividade de um fim que sempre pede continuidade.
O fato é que estamos diante
de anotações em torno do que falam os folhetos de feira e não serão exatamente
sistematizadas desta forma que entrarão no texto maior, mas julgamos que elas
teriam suficiente condição de fecharem como um artigo que não seria
propriamente sobre os folhetos, mas como teriam posição na cultura nordestina, muitos
dizendo que expressam uma visão conservadora e o artigo defendendo que a
crônica e a narrativa parecem encontrar na ordem estratégica da denúncia, o
espaço possível.
Faz sentido? É sem dúvida, um filão a seguir mas o trato da questão
em profundidade, teria de ser em outro trabalho; neste cabe apenas a enunciação
da possibilidade. Por outro lado, a defesa de alguns princípios de honra pode
ser metafórica, referindo-se, a partir dela e com facilidade estratégica, a uma
demonstração cabal de relação dominadora e ai muito além do que aparentemente
significa. Não se trata apenas de uma velha noção de honra, mas a demonstração
de que ela pode ser pisada e, em grande parte, no que lemos, o folheto a ela se
refere quando trata dos desníveis entre senhor e, no caso, flagelado que
simboliza o desfavorecido. Isto pode ser colocado em evidência em diversos
casos; sempre a honra é atingida pela prepotência que é narrada.
Na medida em que falamos de narrativa, admitimos que a arte enuncia
a vida de uma forma, de uma determinada maneira e, ao narrar, se pode
introduzir a análise e incorporar um ensaio que está, sobremaneira nas
entrelinhas. Talvez este seja o melhor caminho para ler-se o folheto: andar
pelo que não está implícito, pelas grandes sinalizações escondidas. Não se pode, simplesmente, acentuar o folheto
de feira como catalizador de uma ideologia conservadora, sem antes perguntar e
discutir o espaço que tem para falar e como falar. É impossível deslocar o folheto do contexto
a que pertence e ele vai ter de encontrar maneiras de estar presente em um
universo que não é por ele acompanhado.
O que está anotado aqui, deve ser considerado como um primeiro
esboço do que poderia estar sendo considerado como pronto para a publicação.
Então, poderia ser considerado como apressado. Talvez na continuidade do
trabalho vá crescendo, mas o texto nos parece guardar uma unidade e é isto que
nos anima a publicar.
A história vinda de baixo: o folheto de feira e a seca (I)
Luiz Sávio de Almeida
A permanente
ressurgência
A tarefa de listar as secas
que aconteceram é interminável pois, na realidade, ela existe todos os anos,
desde que tem o atributo da
perenalidade. Neste sentido, deve ser
entendida como algo que não acaba pois, dentre outros fatores, é
inerente ao semiárido, um conjunto físico. Apesar de parecer contraditório,
mesmo nas melhores chuvas ela existe em sua ancoragem e significado cultural e
político, vivendo uma dupla condição: a de estar latente e a de estar
manifesta. É claro, no entanto, que ela não se repete e, assim, cada seca tem a
sua particularidade e, portanto, cada uma se define por ser diferente na sua
forma de ser e de acontecer.
O ideal, por
consequência seria sempre expressá-la no
plural, salvo quando estiver particularizada e atribuída a determinado tempo. É
isto que fundamenta a historicidade: ela
é uma relação política, ligada ao
semiárido. O que muda nele, muda na seca. Neste sentido, a que ocorre no século
XVI jamais poderia ser considerada igual
à que se desenvolve nesta etapa do século XXI. É a contingência do tempo e do
movimento inerente à formação histórica.
Claro que estamos diante de
algo chamado água e sua contradição que seria a “nãoágua”; este é o dado
fundante das secas que são, por um lado, resultado e, por outro, construção. Em
última análise, ela decorre de determinado tipo de resposta em determinada
condição histórica e está ligada à construção do espaço. É no conjunto de
semiárido que se fundam os sertões e, com eles, um sentimento de pertença e de
possibilidade de individualização: existem os daqui e os dali como se vê no
sertão do Cariri, sertão do Moxotó, do Piancó, Bodocó, Caicó; a literatura
fabrica o alto sertão, o de fora e o de dentro e, por aí, identificações são produzidas dentro do
semiárido onde ocorrem os sertões do sertão.
Neste mesmo
entendimento, se pode indicar o sertão
das Alagoas, de Minas e tudo anda por
onde andar o semiárido que cobre, também, o agreste. Em um conjunto entendido
como sertão tem-se diversos, mas, nesta diversidade, ocorre a universalidade do: o sertanejo, elemento
chave para a construção de uma cultura que, entre outros fatores, ocupa-se da
seca com entendimentos, comportamentos.
Bem se pode dizer, como imagem, que a seca
vive o processo de ressurgência; se
encontra no profundo do cotidiano e interliga o semiárido, sendo, inclusive, o
primeiro grande pressuposto a informar sobre a constituição do que atualmente
se chama de nordeste. O que vamos chamar de ressurgência é simples: este componente do profundo, desesconder-se e
dar-se claro no dia a dia do sertanejo.
O presságio e a vida
Nestas terras sertanejas,
buscar sinais de como estará o tempo, e, portanto, a vida, é tarefa que se aprende desde criança, ao se
ver o olhar para o sol, as novenas, as conversas e modos de prever, atitudes
que entram e rompem ano. A seca é eterna
antecipação; além do drama humano que se desenvolve, está ligada a frágil funcionamento do setor
primário da economia. É quando, nesta fragilidade, o sagrado assume a posição
central das promessas e das procissões, a seca tornando-se um ritual religioso.
A religião e a ciência
estarão nesta seca; a primeira em busca de proteção e milagre e a segunda em
busca do conhecimento gerado no dia a dia da vida, na procura de sinais que indicavam
o rumo que o tempo correria e, isto, para uma sociedade organizada em produção montada sob o risco na
pecuária e na agricultura. Tratava-se de
uma sociedade vulnerável onde a seca não era e nem poderia ser
considerada perigo ou, mesmo, ameaça episódica a vir aleatoriamente pelo azar.
Ela jamais deixava de desesconder-se.
Seca, jamais seria uma surpresa.
Ela se anuncia de muita forma e de diversas
maneiras como nos pássaros, nos astros, no mundo sempre ao nosso derredor e não
é preciso muita ciência para vê-la, basta ter aprendido, saber observar, ter
olhos para ver e ouvidos para ouvir. O anum preto esta ali pousado, debaixo da
árvore verde e frondosa por mais de três dias, o que digamos é muito difícil:
então, o ano será bom, conforme Cascudo registrou[i].
Dizem que também o maribondi-enxum com sua casa imensa, indica sobre a chuva;
se a casa dele é no baixo, então vem seca[ii]
Uma pequena derivação para o Lunário
Ciência e religião na
circularidade que a cultura pressupõe deva existir, sempre souberam, por
exemplo, de São João, São Pedro, pucumã, o sal, o circulo na lua. E antigamente
no corpo das grandes leituras, entre os 12 Pares de França e a Missão Abreviada
tinha-se o senso erudito do Lunário Perpétuo. O Lunário
foi uma das grandes leituras na colônia, pontificando, inclusive, pelos anos de
Império, quem sabe derivado de textos que vinham se arrastando pela Idade
Média; existe Lunário publicado na
Itália em 1535, Espanha em 1606 e já estava em terceira edição com texto
revisto e aumentado pelo seu criador que era Jerônimo Cortes, nascido em
Valência. Como se pode notar, a ideia de Lunário
e de Perpétuo é antiga, inclusive
fora da Península Ibérica. O título que praticamente se repete em português,
espanhol e “italiano”; daí, se pode
notar a importância da lua no universo cultural que se forma no Brasil e tudo
deve convergir para um tronco que não está claro para estas anotações. É dito
que em 1703 aparecera publicação em Lisboa e, sem sombra de dúvida nesta
oportunidade ou antes, virá plantar-se em nossas leituras.
Sempre se teve a
necessidade destas indicações e sempre se desejou um instrumento perpétuo sobre as fases e vizinhanças da lua , o que
alcançou uma boa estirada pelo século XX, com os marca mês e folhinhas pregadas
nas paredes das casas. A lua sempre nos foi vital, não somente para os grandes
fenômenos, mas, inclusive, para os menores de nosso dia a dia o que está,
claramente, presente no termo aluado, na
expressão em que se diz que depende da lua e mesmo no mágico da lua beber a
água de coco e não poder bater no pescado salpesado, sob pena de se arruinar a
carne, da mesma forma que detiora a água do côco que foi por ela bebida.
Há, por exemplo, um lunário
publicado por Gaspar Cardoso de Sequeira, matemático nascido em Murça e
oferecido ao Senhor de Almada[iii].
Isto em 1626 e sendo uma nova edição. Havia consumo, havia utilidade e
popularidade. A lua era mercadoria,
tinha agregação de valor. Pensar como seria o tempo era e sempre foi básico;
imagine-se o que não estaria significando para um contexto agrário, mormente
onde o sofrimento coletivo estaria à espera de começar. Parece, então, existir
um tempo sempre assuntado e se viveria a carga da busca pelos sinais, como se a
leitura da natureza tivesse sido aprendida pela tarefa de pensar a
possibilidade de sofrimento.
É onde aparece a ciência da
pedra de sal a procurar a umidade, a queda da pucumã, o voo das formigas que
terminam por perderem as asas. Bem antes de chegar as novas chuvas, São
João, São Pedro são acionados, como se
da festa dos santos saíssem, também, as águas, numa espécie de continuidade desta
comunhão no sagrado; fisicamente, acabou o sertão distante, as distâncias foram
refeitas pela velocidade, mas ainda existe e existia no XIX um sertão
recôntido, um, sertão no profundo de sua construção cultural que precisava
saber da e sobre a seca.
O antigo coração
Paulatinamente foi acabando
o desconhecido, remontando-se o senso do espaço e o sertão deixando de ser “o interior, o coração das terras” e não
muito pode-se dizer que é “mato longe da
costa” conforme grifava Antônio Moraes Silva[iv],
natural do Rio de Janeiro, que atualizou e reformou o diccionário do Padre D. Rafael Bluteau. O sertão aproximou-se,
apresentou-se, mas continuou a ter as suas marcas profundas e a seca é uma delas no que as incertezas do
tempo indicam e indicavam o caminho ou os caminhos a serem seguidos, até mesmo
quando se tentava persistir em ficar; seria aquele que sairia por último, o que
era verdadeiramente expulso, o descrito por Luiz Gonzaga em o Último Pau de Arara e que somente
largaria a terra no fim do que não poderia terminar. Era um pouco diferente do
adeus à Rosinha de Asa Branca – do
Gonzaga e do letrista fantástico que foi Humberto Texeira – que ficou e tornou-se lembrança e depois resultado de retorno
quando o trovão redondo ou de chicote reboa em A volta da Asa Branca.
O lírico da Rosinha sempre
será sinal de volta para quem foi de um
mundo de seca para tentar a vida; ela
ficou em Propriá, na beira do São Francisco, no confronte do Porto Real do
Colégio e olhando São Braz. Asa Branca surge como marca sertaneja, a poética
nordestina a fez símbolo; existia de monte por aqui e um dos sinas dos tempos
aponta que sumiram; elas ajudam a demonstrar como a história fica na arte.
[i] CASCUDO, Luiz da Câmara.
Aves e pássaros no folclore brasileiro. Revista
do Livro, Ano V, Nº 19, 1960.
[ii] NOMURA, Hitoschi. Superstições
e crenças sobre abelhas, vespas e formigas. O Estado de São Paulo. São
Paulo, 14 jul. 1982, p. 5.
[iii] SEQUEIRA, Gaspar Cardoso de. Tesouro de prudentes novamente
tirado a luz, por Gaspar Cardoso de
Sequeira, matemático, natural da Vila de
Murça. 2ª ed. Lisboa: Nicolau Carvalho Impressor: 1626.
[iv] SILVA, Antônio de Moraes. Dicionário
da língua portuguesa recopilado dos vocabulários até agora impressos, e nesta
segunda edição novamente emendado, e mui acrescentado, por Antônio Moraes da
Silva natural do Rio de Janeiro. Oferecido ao mui alto, e mui poderoso Príncipe
Regente Nosso Senhor. Lisboa: Typographia Lacerdina, 1813.
quarta-feira, 25 de setembro de 2019
Uma entrevista sobre Alagoas para o ocho2.com,.br
http://ocho2.com.br/luiz-savio-de-almeida-alagoas-e-mais-um-sentimento-do-que-uma-realidade/
terça-feira, 24 de setembro de 2019
Escravidão em Alagoas
Gian Carlo de Melo Silva é doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE e professor da Universidade Federal de Alagoas-UFAL. Ainda é docente nos cursos de pós-graduação em História da Universidade Federal de Alagoas-UFAL e da Universidade Federal Rural de Pernambuco-UFRPE. Organizador de coletâneas como: Cultura e Sociabilidades no Mundo Atlântico (2102), Políticas e Estratégias Administrativas no Mundo Atlântico (2012), ambas pela Editora Universitária da UFPE; Os Crimes e a História do Brasil (2015) publicada pela Edufal e premiada pela VII Bienal do Livro de Alagoas; História da Escravidão em Alagoas (2017) lançada pela Edufal e Imprensa Oficial, com premiação nos 200 anos de emancipação política de Alagoas. Além disso, publicou Um só Corpo, Uma só Carne (2010, EDUFPE e 2014, Edufal) e sua tese de doutoramento com o título Na cor da Pele, o Negro (2018, Edufal). Em 2018 também organizou e publicou com Wilma Nóbrega a obra Olhares de Maceió por Luiz Lavenère, um catálogo com fotos de Maceió no início do século XX (Graciliano Ramos).
Brazilian hisrory: slavery / Histoire brésilienne: l'esclavage / Storia brasiliana: schiavitù / Brasilianische Geschichte: Sklaverei
Uma pequena introdução
Danilo Luiz Marques, Gian Carlo de Melo
Silva & Luana Teixeira
O livro História da Escravidão em Alagoas reúne uma nova geração de historiadores que vem pesquisando e inovando a historiografia alagoana sobre escravidão. Propomos presentar ao público leitor, estudos sobre a escravidão em Alagoas que privilegiam as experiências de vida de sujeitos históricos marginalizados pelo poder e que resistiram à instituição escravista. Também faz parte desta coletânea, reflexões acerca da historiografia alagoana sobre o tema e o local da população afrodescendente nessas narrativas. Esta produção vem, desde o século XIX, privilegiando uma história de homens brancos, escravocratas e católicos.
Nas
primeiras décadas do século XX, os estudos sobre o negro na historiografia
alagoana se concentraram no folclore e na negação de suas resistências durante
a escravidão. Em 1934, durante o 1º Congresso Afro-Brasileiro, realizado em
Recife, Alfredo Brandão, ao apresentar sua pesquisa intitulada Os Negros na
História de Alagoas, expôs que estes eram “conformados com a sorte” e, apesar
de serem obcecados com a ideia de liberdade: “nos tempos posteriores ao
quilombo (Palmares) a obsessão não o levava a revoltas e a reações a mão
armada” (BRANDÃO, 1988, p. 45). Nesta concepção, nega-se todo um histórico de
lutas e resistências protagonizados por povos da Diáspora africana e seus
descentes na região, algo que se tornou bastante característico entre os
pesquisadores da temática em Alagoas. Alfredo Brandão desenvolveu seus estudos
influenciado pelo pensamento de Gilberto Freyre, assim como Manuel Diégues
Junior, que pertencia ao grupo de pesquisadores liderados pelo sociólogo
pernambucano na década de 1930, na cidade do Recife. A obra de destaque do
autor é O Banguê das Alagoas (1949), onde analisa a vida social alagoana tendo
como eixo norteador o sistema açucareiro, uma escrita que mescla factualismo
com folclorismo.
Abelardo Duarte, outro pesquisador alagoano
que se debruçou nas chamadas “culturas negras”, se concentrou em documentar a
presença africana em Alagoas, publicando livros de referência, como: Episódios
do contrabando de africanos nas Alagoas (1966), Os negros muçulmanos nas
Alagoas: os Malês (1958) e o Folclore negro das Alagoas (1974). O autor
integrava um grupo de folcloristas conhecido como Escola de Maceió, que se
caracterizou pela retomada do modelo culturalista de Arthur Ramos, alinhavada à
Escola Nina Rodrigues. Felix Lima Junior também foi dessa geração e escreveu o
livro A escravidão em Alagoas (1975), o qual nos oferece informações sobre os
costumes da sociedade alagoana e os processos de alforrias ao longo do século
XIX.
Nos
anos de 1960, o renomado historiador alagoano, Moacir Medeiros de Sant’Ana
começou a publicar suas pesquisas, onde muitas delas, trataram diretamente da
temática da escravidão. Este autor foi diretor do Arquivo Público de Alagoas
durante décadas, conhecendo como poucos o acervo da instituição. Desta maneira,
seus trabalhos possuem um denso arcabouço documental. Em Uma Associação
Centenária (1966), uma obra feita por encomenda para celebrar o centenário da
Associação Comercial de Maceió, o autor fez uma breve análise histórica da
capital alagoana em 1866, descrevendo ruas e bairros. Também expôs alguns
aspectos da escravidão, sobremaneira acerca das fugas e anúncios em periódicos
locais e leilões de escravizados. Ao fazer uma história econômica da produção
do açúcar na região alagoana, Sant’Ana em seu Contribuição à História do Açúcar
em Alagoas (1970) dedicou algumas páginas aos trabalhadores escravizados,
trazendo dados estatísticos importantes. No final dos anos 1980, em virtude do
centenário da abolição da escravatura no Brasil, publicou três livros sobre a
temática. O primeiro deles: A Queima de Documentos da Escravidão (1988) tratou
da portaria de Rui Barbosa de 14 de dezembro de 1890 para queimar todos os
papéis, livros e documentos do Ministério da Fazendo acerca do “elemento
servil”. Em 1989, Sant’Ana lançou um levantamento bibliográfico sobre
escravidão em Bibliografia Sobre o Negro. No mesmo ano, publicou o Mitos da
Escravidão (1989), onde questionou as ideias do senhor bondoso e do negro
submisso e intelectualmente inferior.
Um
dos principais problemas enfrentados pelos historiadores que decidem dedicar
seu trabalho a pesquisar escravidão em Alagoas diz respeito ao acesso e às
condições dos arquivos existentes no Estado. Fontes existem, bem como uma
sólida legislação que prevê sua preservação por parte dos órgãos competentes e
garante o acesso à comunidade científica e ao público geral. No entanto, quando
se trata de instituições que detêm acervos relacionados ao período de vigência
da escravidão no Brasil, apenas o Arquivo Público de Alagoas, que vem se
modernizando e aperfeiçoando na gestão de seu valioso acervo, e o Instituto
Histórico e Geográfico de Alagoas, histórica instituição de coleção e guarda de
documentos e lócus de pesquisa de gerações, cumprem adequadamente o papel de
proteger e fomentar o patrimônio histórico e cultural representados pelas
fontes documentais. Muitos outros acervos serão citados ao longo desta
coletânea, mas nenhum deles possui uma política arquivística adequada de
preservação e guarda dos documentos, sendo que o acesso aos mesmos precisa
sempre contar com uma boa dose de paciência, negociação e até mesmo
encaminhamento de processos administrativos demorados, que nem sempre
correspondem aos cronogramas exigidos pelas agências de fomento. Espera-se que
a divulgação das pesquisas atuais possa sensibilizar um maior número de
gestores públicos para a importância de preservação e organização de seus
acervos institucionais, viabilizando cada vez mais a ampliação da pesquisa
histórica em Alagoas e a valorização do profissional de história no Estado.
Escravidão e Possibilidades de Alforrias no
Período Colonial: Capitania de Pernambuco – Comarca das Alagoas
Gian Carlo de Melo Silva
A presença dos primeiros africanos em território Pernambucano data do século XVI. Em tese só foram desembarcados a partir do alvará de D. João III de 1549 autoriza a entrada de cativos vindos da Guiné e São Tomé, limitados a 120 peças para cada engenho montado e com capacidade de produção (SILVA, 1988, p. 107). Antes disso, Duarte Coelho já tentava conseguir o contrato para importação de africanos, algo que não foi concedido pela coroa, porém não é possível saber a quantidade que foi desembarcada antes de 1549.
Tal período coincide com as informações
fornecidas por Diégues Júnior que afirma ser da segunda metade do XVI a
introdução do homem negro em Alagoas (2012a, p. 164). Se a lei de D. João III
foi realizada à risca, os primeiros africanos chegaram aqui para os engenhos
fundados por Cristóvão Lins, seus descendentes e os “colaboradores da obra de
colonização”, como foi Rodrigo de Barros Pimentel, que construiu engenhos de
açúcar. A expansão dos canaviais se estendeu desde a parte norte de Alagoas e [...] continuou estendendo-se; ocupou a
zona das lagoas, marginando os rios Mundaú e Paraíba; atingiu São Miguel. Ao
iniciar-se o século XVII, o litoral alagoano estava colonizado; os bueiros de
engenhos se espalhavam pelos vales dos rios Manguaba, Camaragibe, Santo Antônio
Grande, Paraíba, Mundaú, São Miguel e também pelas duas lagoas: a do Norte, ou
Mundaú, e a do Sul, ou Manguaba [...] (DIÉGUES JÚNIOR, 2012b, p.34-35).
Essa expansão da cana em Alagoas
necessitava do trabalho do homem e da mulher negra. Como lembra Alfredo Brandão
“o primeiro negro apareceu em Alagoas quase com o primeiro branco” (1988,
p.19). Foram os negros um dos atores
primordiais para o processo de colonização, sem o seu suor e esforço físico, a
cana, o engenho, a moenda, a sociedade não teria se desenvolvido. Como lembra
Freyre, algumas das ocupações dos negros no Brasil colonial foram músicos,
sangradores, dentistas, barbeiros e “não apenas negros da enxada ou de cozinha”
(FREYRE, 2006, pp.499-553). Os africanos e seus descendentes são parte
fundamental, um alicerce da sociedade que se formou no Brasil de outrora.
Com o passar dos anos e a presença cada vez
maior de escravos surgem às primeiras libertações, que vão dar origem a um
elemento novo, com uma condição diferenciada entre os negros, são os homens e
mulheres forros. O registro mais antigo de alforrias na Capitania de Pernambuco
que temos conhecimento é o da “negra Anna”, que ocorreu no ano de 1656. O seu
senhor Pero Barrozo disse em testamento que deixava “Anna forra, livre, e
isenta, por ser velha, e me ter feito muito serviço, com muito cuidado de minha
fazenda”.
O ato de alforriar algum escravo, talvez
viesse preencher a vontade descrita por Azurara na epígrafe deste artigo, porém
tinha um significado que mudava a ordenação social, cirando uma geração de
novos homens e mulheres que viviam em uma condição jurídica e social diferente.
Afinal, eram negros, pardos, crioulos, cabras, angolas, minas e tantas outras
designações que passaram a existir nos registros acompanhados do termo forro
após o seu nome.
Sobre a situação do forro, ele passou a ter
um status diferenciado na sociedade colonial, seja em Alagoas ou no resto do
Brasil. Conforme Russel-Wood, os “escravos negros nascidos no Brasil tinham
vantagens visíveis , quando libertados, sobre os negros nascidos na África”
(2005, p. 86). Essa diferenciação ocorria, por exemplo, por ser mais fácil aos
escravos nascidos no Brasil conseguirem alforria do que os que vieram da
África. (SILVA, 2014b & LARA, 2007, p. 128).
Ampliando nossas observações vale lembrar
que no mundo colonial os forros tinham um papel significativo, seja simbólico
para os demais cativos que poderiam ter esperanças de alcançar a liberdade, ou
como uma massa que legitimava o poder, como lembra Mathias ao afirmar que “para
obter sua legitimação social, a elite necessariamente deveria interagir com
todos os segmentos da sociedade” (MATHIAS, 2012, p. 299). Neste processo de
interação é que podemos vislumbrar as negociações dentro da escravidão, que
favoreceu os cativos e seus descendentes a participarem mais ativamente da
formação social do Brasil.
Em sua definição do termo alforria, Sheila
Farias (In: VAINFAS, 2001, p. 30) apresenta a existências de três maneiras para
o ex-escravo asseverar sua condição de forro na sociedade. São elas: a carta ou
o “papel de liberdade” devidamente estruturada com assinatura do senhor ou de
alguém por ele outorgado e que poderia ser registrada em cartório; A outra
maneira era o registro nos testamentos, em que ocorriam as divisões dos bens e
algumas alforrias podiam ser concedidas como reconhecimento da companhia e
trabalho exercido pelo cativo. Por fim a pia batismal, local em que no momento
do batismo o senhor anunciava que forrava a criança.
Assim, a alforria foi uma prática social
corrente no período colonial e era um mecanismo inserido dentro de contextos
próprios e que poderia ser concedida,
[...] solenemente ou não, direta ou
indiretamente, expressamente, tacitamente ou de maneira presumida, por ato
entre vivos ou como última vontade, em ato particular ou na presença de um
notário, com ou sem documento escrito [...] (MATTOSO, 2003, p.177).
Tal prática social foi vivenciada em
Alagoas e, nos servem de exemplo, para observarmos como os senhores e, alguns
escravos, foram atores do cotidiano vivenciado nas terras ao sul da Capitania
de Pernambuco.
Nossas fontes percorrem parte do período
colonial nas localidades de Penedo e Santa Maria Magdalena de Alagoas do Sul.
Cada localidade nos fornece fontes que apresentam alforrias de homens e
mulheres, sejam em cartas de alforrias, testamentos ou registro de batismo.
No início do século XVIII já encontramos
uma prática de alforria que ficou conhecida como coartação , nela, o escravo
alforriado tinha parte fundamental para alcançar sua nova condição jurídica. A
coartação exigia dele um algo mais, que poderia significar alguns anos de
trabalho para completar o pecúlio exigido ou ainda, exercer algumas funções até
a morte do seu senhor. Só após tal exigência é que ele teria de fato sua carta
de liberdade.
Na Vila do Penedo, no ano de 1713 o padre
Manoel Pereira usou de tal artificio em seu testamento. Escreveu que deixava o
meu mulatinho Francisco filho de Izabel coartado em quarenta mil réis que
dando-os será, o valor não seria pago pelo mulatinho, e o cotidiano urbano de
Penedo é que iria possibilitar o acumulo de tal quantia através do trabalho de
sua mãe Izabel ou outro parente da criança.
O mesmo padre ainda era possuidor de alguns
escravos, e trabalhando dentro das lógicas de gratidão e bons serviços
prestados declarou que entre
os escravos que nosso senhor por sua
infinita piedade e misericórdia me tem emprestado e conservado até o presente ,
há Ambrozio Luiz, que foi do Goes o qual na perda do barco que tive, pós
bastante cuidado em me aproveitar a fabrica dele, e há bastantes anos me tem
ganhado com que me ajudou a viver, e assim o deixo forro, livre, e isento de
toda a servidão e cativeiro: e lhe mando viva bem com sua mulher e como
verdadeiro cristão. E Declaro que outro escravo que tenho é Miguel Gomes que
foi do Hermitão de S. Gonçalo, o qual desde que o comprei me serviu, e servio
assistindo-me sempre de noite, e de dia com bastante diligencia, e zelo, e
assim o deixo forro, livre, e isento de toda a servidão e cativeiro: e lhe
mando que nos primeiros três anos depois do meu falecimento me mande em cada um
deles dizer duas missas por mim segundo a disposição da irmandade de Nossa
Senhora do Socorro, em que há muitos anos estou assentado por irmão.
O exercício da piedade cristã ao alforriar
dois escravos seguiu um contexto maior e que acompanhava durante alguns anos o
cotidiano dos escravos e de seu senhor. O primeiro dos forros foi Ambrozio, que
era um escravo casado - obedecendo à lógica de inserção nos preceitos do
catolicismo tridentino , estava ao lado do Padre desde a perda de um barco e
graças ao fato de ter “ganhado”, num possível trabalho de escravo de ganho nas
ruas da Vila de Penedo “ajudou a viver” o seu senhor.
Com sua dedicação cotidiana, Ambrozio
conquistou o reconhecimento do Padre Manoel e foi alforriado em seu testamento,
mas não sem antes prestar a atenção na ultima ordem de seu senhor que era viver
“bem com sua mulher e como verdadeiro cristão”.
Depois foi a vez de Miguel, que tinha nome
de anjo, mas era mais um escravo do Padre e tinha certa vivência no mundo
religioso, pois seu antigo proprietário era um ermitão de São Gonçalo Garcia,
uma das irmandades com maior influência na região (ALVES, 2016). Miguel
acompanhou desde a sua compra o seu senhor com bastante “diligencia e zelo” e
por isso conquistou sua alforria em testamento.
Os detalhes da vida destes dois escravos
podem ser compreendidos ao analisarmos o discurso do seu senhor no momento em
que os deixava forros. Vemos que uma vida de dedicação e obediência ao seu dono
era algo primordial e bastante valorizado, talvez, observando isso tais
escravos conquistaram inserção através da fé católica, seguindo suas regras,
diferenciando-se dos demais e agradando ao Padre Manoel. Por fim, e aqui mais
um momento de realização de ordem, os alforriados ficavam encarregados de “nos
primeiros três anos depois do meu falecimento me mande em cada um deles dizer
duas missas”. Nada mais “justo” para demonstrar a gratidão que esses homens
tinham com seu antigo senhor.
Já em Santa Maria Magdalena de Alagoas do
Sul encontramos a alforria de Maria, que foi libertada pela sua senhora Maria
Joaquina no ano de 1788. Um ato que ficou registrado em cartório, como deveria
ser feito em todos os casos para garantir a segurança do ex-escravo. Consta na
carta de alforria que
Eu Maria Joaquina, que entre os mais bens
que possuo de herança e pacífica posse, e bem assim huma mulatinha de peito por
nome Maria, a qual a forro, e como com efeito forrado a tenho de hoje para todo
o sempre, para que se utilize de sua liberdade de hoje em diante, como se fora
de nascimento, cuja alforria me obriga a fazer boa, firme e valiosa, a custa da
minha fazenda, pois a faço de minha livre vontade e sem constrangimento algum
[...].
Como é possível ver, a mulatinha não foi
alforriada na pia batismal, sua senhora concedeu a liberdade posteriormente e
fez questão de ratificar que sua vontade estava sendo realizada de forma
“espontânea” por sua “livre vontade”. Ressaltam os termos usados por Maria
Joaquina para com Maria, o desejo de “que se utilize de sua liberdade de hoje
em diante, como se fora de nascimento”, podem significar uma relação que
extrapolou os limites entre senhora e escrava. Fazia, no momento da morte, o
reconhecimento de que a mulatinha tinha o direito de ser liberta e viver sua
liberdade como se fosse desde o nascimento.
Outras possibilidades de alforria ocorreram
na pia batismal, em Santa Maria Magdalena de Alagoas do Sul encontramos dois
exemplos de crianças com poucos dias de nascimento que tiveram sua liberdade
registrada. A existência de registros dessa natureza,
as fontes eclesiásticas podem nos ser
extremamente úteis, pois a sociedade construída na conquista americana foi
montada em meio à chamada Contra-reforma Romana, o que significa afirmar que
aquelas gentes, da nobreza da terra aos escravos da Guiné, produziram registros
dando conta a Deus de seus compromissos e atos” (FRAGOSO, 2014, p. 27).
Para dar conta a Deus de seus atos, temos o
primeiro exemplo de batismo com alforria que ocorreu no domingo, dia 14 de
outubro de 1810, quando na Igreja Matriz Joaquim de Oliveira Barros “pôs os
santos óleos” em Marcos, que era filho de Manoel e Joaquina, todos eram
escravos de Maria Francisca e moradores da freguesia. Os padrinhos eram Jozé
Barboza e Antonia Maria, ambos solteiros e juntamente com os demais disseram
que o “dito batizado o havia por forro de hoje por diante”.
Já no ano de 1811 foi à vez de Januária
conseguir ser alforriada. Na quarta-feira, dia 31 de julho do referido ano ela
esteve presente com sua mãe Maria, o seu senhor Joaquim de Santa Anna, seus
padrinhos Jozé Ignacio e Francisca Rodrigues na Igreja Matriz. Lá o padre José
Ignacio do Rego a batizou, inserindo-a no mundo cristão, e logo após o senhor
Joaquim “disse que a dava por forra liberta de hoje para sempre” tirando o
cativeiro do destino da pequena Januária.
Ser alforriado no momento do batismo, como
ocorreu com Marcos e Januária, tem um significado maior para os seus pais, pois
é o fruto do esforço deles que será recompensado com a alforria do rebento. A
próxima geração familiar não teria mais o cativeiro como morada. Alcançavam
através do filho forro, algo que talvez não fossem concretizar tão rapidamente.
Além disso, os pais e os filhos ampliavam os laços existentes na sociedade, os
padrinhos agora eram parte da família e tinham a obrigação de proteger e zelar
pelos seus afilhados. Eles eram uma extensão da base familiar (SILVA, 2014b).
A observância das práticas de alforria na
Alagoas do século XVIII mostra um pouco da vivência cotidiana de homens e
mulheres que conseguiram mudar sua condição ou a de seus filhos. Estavam sendo
inseridos numa nova perspectiva social, saindo da escravidão para uma
liberdade, conquistada muitas vezes a partir da dissimulação.
Os casos aqui apresentados são apenas
possibilidades para entendermos o desenrolar de um processo que começou no
século XVI em Alagoas e que perdurou até finais dos Oitocentos. Marcando a
construção de uma sociedade patriarcal, com o lastro na grande lavoura
canavieira e na exploração da mão de obra escrava. Mão essa que não existiu
voltada só para o trabalho pesado, viveu e contribuiu para formação social,
para cultura, para economia e que hodiernamente precisa ser cada vez mais
valorizada em sua existência e sua história.
domingo, 22 de setembro de 2019
Culto afro-brasileiro: Tia Marcelina e o pintor Zumba (I)_
Afro-Brazialian religion: history, memory and emotions
Religione afro-brasiliana: storia, memoria, emozioni
Religion afro-brésilienne: histoire, mémoire, émotions
Religión afrobrasileña: historia, memoria, emociones
Painter
Afro, Historia, Cultos, Artes, Memória, Pintor Zumba
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Mestrando em Culturas Populares
na UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE- UFS Especialista em Arte, Educação e
Sociedade no CESMAC. 2014/2015. Graduado em Ciências Sociais- antropologia pela
Universidade Federal de Alagoas UFAL 2013. Cenotécnico da Escola Técnica de
Artes ETA / UFAL Área de pesquisa :Antropologia,Culturas Populares,
Identidade,Educação, Preconceito Racial. Área de atuação :
Cenografias,Ambientação cênica,Pintura artística,Direção de artes,
Esculturas,movimento sociais. Coordenador Geral do Sindicato dos Trabalhadores
Técnicos da Universidade Federal de Alagoas- SINTUFAL- gestão 2013/2015. Membro
da Câmara Acadêmica da Universidade Federal de Alagoas- UFAL (2013/2015).
Membro do Conselho Universitário da Universidade Federal de Alagoas-CONSUNI (
2013/2015). Membro do Projeto de Extensão da UFAL: Fórum Mestre Zumba:
Pensamento em Artes Afro Ameríndias desde 2013. Suplente do Conselho Estadual
de Promoção da Igualdade Racial de Alagoas 2013-2015. Membro do Conselho
Universitário da Universidade Federal de Alagoas-CONSUNI ( 2016/2018). Membro
da Câmara Adâmica da Universidade Federal de Alagoas-CONSUNI ( 2016/ 2018).
Diretor da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores técnico-administrativo em
Instituição de Ensino Superior Publicas do Brasil- FASUBRA gestão 2012/2014.
História, memória e emoção
Luiz Sávio de Almeida
Não gosto de dar entrevista; ela é sempre traidora e , até mesmo, o
entrevistado se obriga a falar dentro do recorte realizado pelo entrevistador, bastando isto para surgir uma série de
problemas. Então, quando me pedem algo, por exemplo, ds parte da imprensa, eu digo para me mandarem as perguntas e com
calma tento responde-las, at´pe mesmo para colaborar com o próprio jornalista.
Gravar entrevista, é muito raro. E entrevista longa, mais raro ainda, pois
quanto mais tempo você fala, mais besteira você sai dizendo: é melhor ser burro
no mais curto espaço de tempo. No entanto,
quando é um trabalho acadêmico, eu sempre falo livremente.
Foi surpresa quando fui procurado pelo Jeamerson para
falar sobre uma tela do Zumba: a da Tia
Marcelina. Eu jamais pensei, quando fazia e faço as coisas, que aquilo tem
alguma importância: eu vou mais pelo impulso– e preparado para aguentar as
consequências –, do que estudado. Tenho me dado mal e tenho me dado bem, da
mesma forma que aconteceria se eu andasse com uma fita métrica, a tomar medida
sobre minhas falas. Eu não sei se já
havia dito, que a famosa pintura do Zumba havia passado por mim. Os cuidados do
de pesquisador do Jeamerson, havia dito
a ele para ver as raízes da foto.
E, sem dúvida, eu podia narrar muita coisa do que havia acontecido,
por ela ter emergido quando eu estava imerso no povo da macumba – adoro esta
expressão –, procurando, dentre outras coisas, se eu teria condições de propor
um projeto de pós-graduação sobre ele. Foi quando conheci pessoas maravilhosas
e que se atrelaram á minha vida: antes como amizade e hoje como saudade.
Navegar no passado foi aprazível e ao mesmo tempo saudoso. Julguei
que era necessário passar pelo sentimento, dar a entrevista e situar a
participação de muitas pessoas, mormente a de Celestino, Joca e Luiz Marinho;
nisto incluo o próprio Belarmino, no
caso da imagem pintada de Tia Marcelina, o Zumba. Celestino, Joca e Luiz
Marinho são fundamentos da obra do Zumba.
Tia Marcelina bem, poderia ser aquela senhora com o balaio na
cabeça, parada na calçada e em frente a uma casa pobre, nem sei mesmo se de
Maceió. Importa que ela foi reconhecida assim e daquela exata maneira se impôs
e resgata a memória de uma história que jamais poderia ter sido letrada. Esta é
a beleza de Tia Marcelina: ser única e tantas ao mesmo tempo e, deste modo,
responde simbolicamente pela história do próprio povo: o povo da macumba.
Vou contar uma história que não disse na entrevista. Uma vez, a
janela estava aberta e da calçada dava para ver o quadro da Tia Marcelina. Um
homem ia passando e aí parou; olhou para mim e perguntou: É esta mulher que
parava o trem? Eu ia dizer que não? Ele sorriu, e saiu alegremente. Tia Marcelina integra, alegra e representa.
REGISTRAR,
CELEBRAR E AGRADECER : O cotidiano negro em Maceió.
Prof. Sávio:
Eu só queria que o Celestino, que o Joca e o Luís Marinho tivessem ouvindo essa
conversa. Eu acho que deve ‘tá’ por aqui. [Jeamerson - Deve ‘tá’ por aqui sim.]
É
com esse trecho da entrevista que realizei
com professor Sávio para minha
pesquisa do Mestrado em Culturas
Populares, que compartilho com a mesma
disposição e gentileza com a qual foi concedida, suas memórias e
historias que são de importância para
quem quer estudar, conhecer e celebrar a
presença negra pelo olhar da força e da resistência.
Em
minhas pesquisas sobre o artista plástico José Zumba, vou encontrando novos
caminhos que nos leva para o reconhecimento e registro de grandes momentos da
historia dos negros alagoanos, e um desses caminhos nos leva para aqueles
encontros de encruzilhadas: foi
assim a entrevista com o professor e pesquisador Savio de Almeida, relatos de
uma vivencia compartilhada, de
experiência de enfrentamentos, e de
risos sobre a Salva de Exu.
Um
momento de pesquisa mágico, ouvindo mais que perguntando, chegamos onde a
memoria vai a realidade resultante das ações do passado,
ao iniciar nosso encontro com a curiosidade de como chegou ate ao artista plástico José Zumba, a ideia de pintar o
quadro Tia Marcelina e encontramos bem mais do que buscávamos: encontramos os
“anônimos”, que são os homens negros religiosos organizados e
corajosos.
Registrar
parte da historia contemporânea das
lutas travadas em Maceió, por liberdade
religiosa e perceber essa dinâmica pela perspectiva negra é muito
significante, o espaço para os homens
negros e sua cultura e
religião eram absolutamente
perseguidos marginalizados,
invisibilizados; compreender a força do
enfrentamento de tudo isso é o posso afirma como fundamental.
Por
isso a importância da entrevista
do professor Sávio, parte dessa
possibilidade de cruzar nosso caminhar com outros que como lamenta o professor não estão aqui para ver o resultado de
suas lutas, uma Maceió negra que
não se cala mais, que sai as ruas não
pra celebrar o Quebra, mas para
exaltar a resistência de Tia Marcelina,
sai as rua pra afirmar que não somos o que sobrou do Quebra, somos o que
resistiu ao Quebra e resiste ate hoje
pela vida da juventude negra e
liberdade religiosa.
Espero
que o leitor, possa sentir o mesmo, que senti ao ler essas memórias registrada
nessa entrevista, emoção de ter a oportunidade de agradecer e reconhecer a contribuição do professor Sávio, Celestino,
Joca e Luiz Marinho. E em nome deles
agradecer a todos os que
lutaram e continuam lutando.
O povo da macumba e Tia Marcelina: uma entrevista a Jeamerson Santos (I)
Uma proibição policial
É
preciso retomar um pouco o clima, para chegarmos à Tia Marcelina. Houve uma
época, aqui em Alagoas, que a Polícia vigiou os ensaios de folguedo, como, por
exemplo, o Guerreiro e isto sob o argumento de ser motivo de cachaçada, confusão
e de violência... Então eles passaram
por período de pressão policial muito grande. Aí houve um acordo – eu acho que
costurado pelo Théo Brandão: se o Departamento de Cultura liberasse o local para
ensaios, a Polícia não chegaria perto.
Conversando comigo ele disse: - Se eu não fizesse isso, ia ser um problema
muito sério!
Passou
muito tempo desta forma. Eu tinha muita ligação com a Federação dos Cultos
Afro-brasileiros, por conta de amizade com um cidadão chamado Celestino, que
vivia na Igreja de São Sebastião... Vivia ali na Igreja. E era contínuo da Secretaria
de Educação. A gente fez amizade pessoal. E ele era Ijexá. Eu acho que era o
único que existia em Alagoas; era no Jacintinho
daquela época, radicalmente diferente do que vemos hoje. Eu procuro por ele e
não consigo saber onde ficava. Eu acho que é a hora dos cultos começarem a
reclamar a colocação dos Terreiros no patrimônio histórico. Falta pressão em
cima disso.
O caminho
do Traçado
Pelo
Celestino, fiz amizade com o pessoal da Federação dos Cultos Afro-brasileiros; amizade que terminou sendo íntima no sentido
do companheirismo, de viver conversando. E, naquela época, eu motivado pelo Théo
Brandão, que era uma espécie de tutor meu... Bom, Theo e eu e conversávamos praticamente todos os dias, umas duas horas por aí assim... E
tínhamos ligações pessoais. E o Théo me
levou a começar ter interesse em estudar isso. Naquele tempo eu andava pensando
em estudar antropologia. E eu comecei a me aproximar dos Terreiros especialmente
andando com mais três pessoas: uma delas era o Luiz Marinho, Pai de Santo, era Nagô
Traçado, como chamavam. Não sei como é que chamam hoje: Nagô Traçado. Bom, eu acharia interessante que se fizesse um
trabalho sobre o léxico dos Terreiros, as mudanças... Eu acho que seria
interessantíssimo; mas chamavam Traçado.
E eram
ali, a Federação e o Terreiro do Luiz Marinho, lá no lado da Ponta Grossa, que
era um centro de concentração dos Terreiros. Existe um livro, que foi publicado
nessa época, e que tem um título fantástico. Chama-se: Os Tambores na Ponta Grossa. Luís Marinho, profissionalmente era pedreiro e tinha uma lojinha de vender calçados, uma
barraquinha na área do mercado, ali nos lados da feira do Passarinho, perto da
banca do Arthur que era meu fornecedor de folheto de feira.
Sobre
esse Luís Marinho, eu publico talvez o primeiro trabalho que aparece na
imprensa de Alagoas, absolutamente simpático aos cultos. Eram duas páginas
inteiras no jornal, parece-me que O
Correio de Maceió, coisa assim. Ele fala do Terreiro sem qualquer acusação. Eu encontrei o artigo no site da FUNARTE. E aí eu fiz amizade com
Luís Marinho, que começou a achar que era meu Pai de Santo e eu não ia dizer
que não, ‘né’? E fui privando da amizade deles e com isso eu fui tendo uma
grande intimidade com os cultos aqui em Alagoas, principalmente Maceió. Mas eu
não me considerava capaz de fazer uma pesquisa sobre isso. Eu achava que era
uma complexidade muito grande, e que eu não tinha formação. E foi por isso que
eu desisti; foi mais por covardia intelectual do que por qualquer outra coisa. Eu teria de sair daqui para estudar, me
preparar e não podia por razões de família. O resultado é que não me senti
preparado, mas eu me sentia tão bem que não largava. Para
objeto
de estudo não dava, eu sabia que não dava, mas andar com eles, dava.
As amizades
Então,
eu terminei tendo amizade com eles e com muitas Casas de Terreiro de Xangô,
aqui em
Maceió. Eu acho
que eu devo ter conhecido muitas e muitas e muitas Casas aqui. Eu não perdia saída de Iaô. Acontecia
uma, eu ‘tava’ lá, com esse pessoal. Era o Luís Marinho, era o Celestino. Esses
dois eram dirigentes da Federação dos Cultos Afro-brasileiros, uma entidade que merece um belo estudo, até
por conta das negociações que se faziam com o sistema. Apois
bem. E eu gostava, inclusive esteticamente, e ainda hoje de uma beleza
fantástica e isto quer seja de Terreiro rico, quer em pobre. Eu acho que os
pobres, às vezes, têm muito mais beleza. Faz tempo que eu não vou. O último foi
na Mãe Vera a quem adoro.
Apois, ficamos o Luís Marinho, eu, o
Celestino, e aí havia uma pessoa que eu acredito que estava interessada em
fazer política lá dentro, mas que terminou se ligando na gente. Chamava-se
Coronel Belarmino. Morreu faz um tempão. Era uma pessoa muito boa, mas eu acho
que ele era muito ligado a um Coronel do Exército que queria ser Deputado. Mas
ele nunca, junto com a gente, conseguiu fazer a política partidária, porque a
gente não deixava. Ele andava mais com a
gente como amigo. Ele era muito agradável. E era daqueles coronéis antigos, da Polícia
antiga, velha, que tinha muita história ‘pra’ contar.
Então,
eu gostava muito dele. Mas ele tinha essa tentativa de fazer um movimento
político de candidatura lá desse Coronel, que depois mataram: acho que Adauto. O
da polícia que andava com a gente era o Belarmino que o Bráulio brincava
comigo, chamando de Coronel da Macumba, mas só quem falava isto era o Bráulio e
eu. Nunca se usou esta expressão. Falo do Bráulio Leite Júnior. E aí, fiz
também amizade com um camarada chamado Joca. Joca morava lá na Ponta Grossa e
trabalhava pelas canhotas, como a
gente chamava. Não sei como é que chama hoje: pelas canhotas, pela esquerda...
sangue... Era o que chamavam. Ou seja, tinha umas certas ligações e não
seria muito interessante fazer brincadeira com ele. E ficamos amigos. Isso é
importante eu dizer, porque são essas quatro pessoas, comigo cinco, que fazem,
em grande parte, aparecer a história da
Tia Marcelina em alto curso da memória da Seita – como também chamavam.
A Salva de Exu
Então
a Polícia continuava botando pressão em cima dos cultos, especialmente por
conta de um negócio que eu não sei se existe hoje ainda, chamada a Salva de
Exu. A Salva de Exu, já ‘tá’ dito, ‘né’.
Eu já fui ‘pra’ Salva de Exu e era barra pesada, porque a cachaça rolava mesmo.
Então a Polícia, especialmente a partir daí, e o pessoal a reclamar do barulho,
dava no que dava, Maceió já não tinha
mais espaço ‘pra’ você ter os Centros isolados. Os Centros já estavam, por mais
pobres que fossem, em contexto de relação urbana. Você não tinha condições de
ter um Terreiro afastado. O Terreiro ‘tava’ geminado ali com a pobreza que inclusive
ia aumentando por conta da migração que
vinha ‘pra’ Maceió.
É
entre 60 e 70, onde você começa a ter a violência da chegada da marcha migrante
‘pra’ Maceió. E é onde você vai começar a ver crescer as ruas pobres da cidade, mas numa
expansão alta! As grotas e tudo vão nascer um pouco depois daí. Mas na hora que
essa pobreza chega, ela chega num lugar onde poderia ter sido considerado
afastado, mas agora mais não. O Centro ‘tava’ ali, parede com parede. Se bem que esses cultos, só eram relizados uma
vez na semana, duas... Assim era a vida do culto, da época que conheci. Era
muito ‘pra’ dentro do culto e muito pouco ‘pra’ fora, porque ele não podia ‘tá’
saindo ainda. Então era uma espécie de contido, revertido para si mesmo.
Nunca
deixou de existir perseguição; ela não acabou com o Quebra; e o que vem depois
precisa ser estudado. Eu até escrevi isso em alguma coisa. Na década de 30, por
exemplo, a perseguição foi grande! Eu tenho um livro raríssimo! Não sei nem
como eu consegui; foi escrito por jornalista
que passa por Maceió nessa época e acompanha a polícia perseguindo alguns
Terreiros: década de 30.
A
ligação se estreita
Apois,
começa haver essa empatia minha. Agora pronto, eu cheguei no termo que eu
queria. Essa grande empatia que ainda hoje eu tenho manifesta, com relação aos
cultos, mas eu já tinha visto que eu não podia estudar. Era preciso que eu
fizesse uma remontagem da minha formação, porque ela era em Direito, e o Théo,
acho que sentindo em mim alguma espécie assim de não sei se talento ou da possibilidade de
interesse por essa área cultural, me fustigava e aí me disse: ‘Vá estudar os
Terreiros! Estudar os Terreiros... Depois que Arthur Ramos ninguém vê isso”. Então eu por brincadeira respondi: “ E por
que é que o você não estuda?”
A
temática negra não penetrava na inteligência de Alagoas da época. Então, você
veja que isso que eu ‘tô’ lhe dizendo dá um pouco da magnitude do problema
geral do negro desse momento que nós vivíamos. Você transformar o negro, objeto
de plena perseguição, num sujeito que tinha história e num sujeito que tinha a
sua cultura e não era a excrescência que se dizia... Isso era um afrontamento
‘pra’ muita coisa. Era preciso ter peito.
Eu
nunca pensei, naquela época, que era importante
o que a gente fazia. Eu ‘tô’ vendo os
caras que ‘tavam’ comigo e vendo a importância deles e não a minha, agora que
voce me faz olhar a importância do que vivemos. Aí você tinha uma temática
negra perseguida em sincronia com a perseguição que viviam. Ela não aflorava. Ela
no máximo chegava ao Abelardo Duarte, mas ligada à ideia de folclore. O
Abelardo Duarte tem uma grande importância, não é porque ele rompa, mas ele tem
coragem de ser diferente.
Ele
não tinha uma antropologia capaz de romper com o que, tradicionalmente, se
montava com relação ao conhecimento da cultura de Alagoas. Havia uma cabeça
ibérica, de formação ibérica. A África quando chegava aos estudos, não chegava
visível, porque o negro não era visível. Não era que houvesse maldade, era como
se a cortina que existisse, fosse de tal forma fechada na vida política e
social normal, que ela impedia o campo acadêmico de existir.
Um
rompimento
E
veja os rompimentos. De uma hora ‘pra’ outra, você vai ter uma estrutura
intelectual se vinculando aos cultos e você ‘tá’ num momento em que era eles
eram negados pela polícia. Macumba não era tema. Macumba era negócio de macumbeiro! E não
seria apenas por ser de negro. Eu acho que era também pelos interditos
religiosos, alicerçados pela Igreja Católica e pelo kardecismo, que considerava
isso coisa de segunda linha, de terceira linha, negócio assim da periferia: espírito
vindo a frequentar os Terreiros, não
poderia ser boa bisca.
Aí o
que é que acontece? Eu passo a frequentar isso e a ter interesse. Alguma coisa eu teria condições de fazer do
ponto de vista intelectual: era estudar a distribuição geográfica dos
Terreiros. Quem faz o primeiro estudo deles aqui neste sentido, somos nós. A
verificar a distribuição geográfica dos Terreiros em Alagoas... Agora, imagine
a importância desse troço lá naquele tempo. Hoje tudo é graça.
E como
é importante registrar, porque se você não registrar ‘tá’ perdido... E é por isso que eu ‘tô’ lhe
dando esse depoimento. Eu não me dei conta, nunca me dei conta de que vivia um
momento importante... Só depois, é que comecei a perceber: quando me falaram. Começamos a trabalhar com
os fichários da Federação. Eu lhe disse que eu perdi esse material todo, já,
‘né’? Ficaram poucas coisas. A complexidade, por exemplo, desse negócio de ser
Nagô, de ser Jeje, na minha cabeça, eu não tinha condição, eu não tinha
formação, eu não sabia o que era isso e demoraria para saber se fosse me meter.
Um
lugar a trabalhar
Mas
saber onde ‘tava’ o ‘lugar’, eu sabia. E comecei a mapear uma série de elementos
e a descobrir um troço que ‘pra’ mim foi muito importante, tendo descoberto
isto com o Théo Brandão. O Théo me disse uma vez o seguinte: “Olha, Sávio, o
segredo ‘pra’ você matar o que é que é o Terreiro em Alagoas, em Maceió, é entender o que é que é isso que
é chamado de Traçado”. Aí minha cabeça ficou
todo o tempo pensando o que seria esse Traçado. Traçado, sentindo que ele tinha
história; apenas sentindo.
Fui fazendo pequenas coisas que eu podia fazer
sem me assustar com a responsabilidade: sobre a nomenclatura dos Terreiros etc.
e tal. Tudo isso perdeu-se! Nomenclatura dos Terreiros, eu comecei a anotar
isso. Bom, e decidi tomar uma atitude
que eu achei que era séria: ‘desfolclorizar’ esse negócio e ter coragem de ir
‘pra’ imprensa defender. E jamais ‘folclorizando’, porque meu medo era esse.
Meu medo era que ‘folclorizasse’ a questão e deixasse de estar com o negro.
Então
fica essa vida de ida e vinda... De tal forma que eu achava que eu já era
macumbeiro também. Era macumbeiro. E onde tinha... Saía ‘pras’ festas etc. e
tal, vivia na Federação... Eu gostava deles. Eu nunca frequentei o lado do
Maciel. Isso eu nunca frequentei não. Mas engraçado, eu acho que eu tenho tudo
que saiu na imprensa, sobre quando Maciel quis ser o rei do Candomblé. Eu acho que eu tenho tudo guardado, mas onde
‘tá’, não sei. Dá outro grande trabalho,
mas isto foi bem depois: merece também um estudo: a nobilitação do Pai de Santo.
O
povo da macumba e Tia Marcelina: uma entrevista a Jeamerson Santos (II)Quadro de Zumba |
Aí um
dia, eu ficava assim pensando onde é que estava a história disso tudo: onde
estava registrada. Eu não tinha ainda a formação suficiente ‘pra’ poder
entender a questão de memória, ‘pra’ entender a questão de identidade. Digamos
assim: eu teria muito mais uma base filosófica do que prontamente uma discussão
de uma temática antropológica ou histórica.
. E vai essa integração todinha e é
sempre esse sentido
que não existia a história registrada e teria de estar na memória. Por isso é
que eu volto muito depois ‘pra’ poder tentar trabalhar essa história, mas eu
nunca escrevi; é material mais recente, embora com uns 20 anos e isto já faz
diferença. Eu tenho todo o material, mas nunca escrevi.. São horas de entrevista
sobre a história de cada Centro que visitei.
O que
me impressionava era no que divergiam, no que os Centros eram diferentes. É
muito fácil você ver o que é igual e é muito difícil você perceber porque que o
diferente é construído em detalhes. Eu tenho todas essas gravações feitas e
estão no IPHAN, pois dei ‘pra’ eles talvez o mais importante acervo de registro
oral sobre os Centros que deve ter sido feito pelos 80 ou noventa.
Importantíssimo.
Nós
fomos a muitos Terreiros, inclusive no interior e isto é essencialmente
importante no acervo. Essas gravações, que eu acho que devem ser recuperadas,
trabalhadas, estão no IPHAN, em disco e em fita. Isto dá uma bela tese, um belo
livro. Embora que ela se perder é um troço muito triste. O Clébio andou nesses
Terreiros comigo nessa segunda etapa. Há muito tempo depois. Isso aí vai ser,
acho, na década de 80, por aí assim. É um
tesouro: dá dissertação, tese, livro. Talvez valesse a pena, alguém apresentar
um, projeto para transcrição das fitas. Está também no IPHAN um importantíssimo
acervo sobre a história indígena, um
raro acervo de falas indígenas.
E
vamos para o Zumba
O Zumba
é um exótico negro ‘pra’ burguesia. O Zumba era um artista que tinha que ser
camelô de si mesmo, mas era reconhecido pelo povo da Macumba. E foi esse
pessoal da Macumba que fez minha aproximação com ele. Eu não tive essa
convivência de intimidade. A minha relação com o Zumba, acontece em torno da Tia Marcelina. Então
veja: eu sempre comecei a achar que faltava a... Hoje em dia eu falo em memória
registrada. Foi quando eu tomo conhecimento do Quebra. E aquilo ficou na minha cabeça
Você
‘tá’ vendo como o Théo foi importante na minha vida, ‘né’?. A minha cabeça não chegava lá, mas pressentia
essa questão da história. Como é que foi a história desse povo e como é que é
possível escrevê-la? Mas como eu digo: eu me julgava incapaz de mexer. Se eu
fosse mexer, eu não iria pelo viés antropológico. Eu ia pela recuperação dessa
história. Você pode ver que quase todos
os trabalhos que passam pelo Quebra,
tratam muito mais da estrutura branca do que da referente ao negro. E a
documentação que pegam é só branca, porque não tem negra! A documentação negra
é auricular, no ouvido, a comunicação era essa.
Então
você tinha um marco que depois virou ficção, no sentido de que extrapolou a condição.
O Quebra aparece muito por conta da
política branca. É extremamente difícil ter plantada uma ótica negra, porque
você teria que ”imaginá-la”. Em grande parte do que se fala sobre o Quebra é estruturado de três, quatro ou
cinco reportagens vagabundas do Jornal de
Alagoas. E, quando na verdade, o que está por trás é a grande estrutura de
perseguição, que aflorava religiosamente, à população negra. Você veja que se
você for tratar bem a questão... Estava em jogo a destruição do negro com sua cultura
na condição urbana. Não, é porque diziam
que o governador era lebá... Nem um lado
e nem o outro estaria com o negro.
Ele
era chamado de Léba, porque você estava com a contradição do negro aflorando
ali e não pelo fato de Euclides Malta ser macumbeiro. Agora, por que é que um
negro representava esse perigo? Por que era negro? Por que era pobre? Ou ser
pobre era ser negro? Então você tem um problema aí, que é imenso ‘pra’ você se
situar, porque o Quebra nem sequer
foi arranhado ainda, eu acho, sabe. Apesar de magníficos trabalhos. O trabalho do
Rafael ´´ é um belo texto, ‘né’. Outros
trabalhos que têm por aí, são trabalhos interessantíssimos! Mas eles não
conseguem o que era o momento negro embora aflorem muito do que seria este
cotidiano onde o religioso era apenas um detalhe.
Eu
acho que você verá parte do momento negro do Quebra, muito mais pelo que estava consignado nas estruturas de
fora da alta elite da disputa política. Eu acho que é muito mais importante
você estudar, por exemplo, a presença do Quebra...
Vá estudar a Liga dos Republicanos Combatentes, porque ali você começa a
verificar que ela passa por baixo, trabalhando as contradições que existiram no
fundo dessa cultura onde o negro também estava em contradição. Ou seja, o fato
de você ter uma determinada caracterização física não implica. Eu por exemplo,
aprendi com Joel Rufino, um grande amigo meu. Aprendi que a gente se
escolhe, muitas vezes. Se você me perguntar: “ Você sabe se é negro?”. Aí eu digo: Não sei,
mas sou. Sou como?
Quando
estou na plataforma da igualdade, de todos aqueles que querem uma condição
justa, então eu sou negro. Eu escrevo ‘pra’
caramba sobre negro, mas nunca escrevi
me considerando negro, nem com procuração negra, nem negro nunca me pediu que
fizesse. Eu escrevi com a minha mão. Não sei se dá ‘pra’ me entender. [Sim, sim, fala do entrevistador]. Eu escrevi com a minha mão, e ali eu sou
negro, ali. Negro, naquele espaço que a gente criou, que é um espaço da
igualdade, que é um espaço de somar diferenças. Mas eu não tenho um histórico
de vida negra. Eu nunca vivi na periferia, não sei nem que porra é! Apesar de
que você vai ter um espanto do caçamba, agora: meu pai pediu esmola. Mas eu
nunca vivi a esmola de meu pai. Eu já vivi meu pai funcionário do Banco do Brasil.
Era outra coisa.
Quadro do Zumba |
Você
percebeu o que eu quis dizer, né? [Sim,
sim, fala do entrevistador]. Então eu não vivi o momento negro. O momento
da exploração não chegou realmente em mim. Eu aprendia isso em casa. Eu não
aprendi isso na rua. Eu não aprendi em Universidade. Eu aprendi que sou igual com
minha mãe falando, com meu pai falando... Bem por aí... Eu me lembro de uma
vez, meu pai era gerente do Banco do Brasil, em Palmares, de Pernambuco. Isso
significa que ele estava entre as autoridades, talvez, da cidade. Eu ‘tava’
sentado, procurei por mamãe, não achei.
Aí
fui ‘pra’ rua. Quando eu vi, a mamãe
tava com uma senhora magrinha, coitada! Ainda me lembro como hoje. Tão
magrinha... E a minha mãe com o feixe de lenha da velinha na cabeça, andando no
meio da rua. E meu pai Gerente do Banco do Brasil! Quando ela chegou, eu disse:
“O que a senhora ‘tava’ fazendo?” Ela: “Carregando
lenha. Você ‘tá’ com vergonha de mim, é? Você tinha que sentir vergonha de mim
se eu não tivesse carregado a lenha, que ela precisava daquilo ‘pra’ viver e
não tinha condições de carregar!”. Só faltou remendar como sempre fazia no fim
do carão: Seu cabrito! Ms eu não estava com vergonha mas orgulhosamente
surpreso.
Voltando
ao início e sobre a história da macumba nas Alagoas... Eu sabia naquele tempo
que ‘tava’ faltando alguma coisa. Na minha cabeça tudo isso existia, tinha um
sentido e era preciso algo que transformasse esse sentido em uma evidência para
escrita. Aquela história negra ‘tava’
muito ‘pra’ dentro, ela não tinha representatividade pública. Agora foi que
cheguei onde queria: a publicidade.
Faltava
uma representatividade pública, porque a própria pobreza não conseguia; não era
o fato de ser a religião em si, mas era aquela própria pobreza que não
conseguia se expressar. Existem momentos de expressão magnífica na pobreza, mas
naquele momento não se tinha a visão dele. Uma vez pensando em hip-hop, escrevi sobre uma grande
libertação urbana em Maceió, da explosão negra em Alagoas quando garotos vão
dançar o hip hop na frente do Cine
São Luís.
Voltando
ao Quebra
Aí essa coisa ficou na minha cabeça. Estava a
ligação pessoal, estava o caminho ‘pra’ trabalhar com o que eu podia, que foi
esse da Geografia da fé e de verificar as titulações dos Centros etc. e tal, de
me preocupar com essa questão do Traçado, que o Théo levantou e ele tinha razão
e com essa falta de representatividade pública da história que eu estava
pressentindo. Por isso é quem vem o texto sobre o Luís Marinho publicado no
jornal. Ele não deve ser bom. Eu tinha o quê? Vinte e poucos anos de idade, por
aí assim. Quando eu leio com a idade que tinha, eu acho um puta e corajoso texto,
sabe? [Sei]. Mas quando eu leio com
a minha cabeça de hoje: P. que pariu! [Risos de Jeamerson].
A TIA MARCELINA |
A
significação política dele independe de prestar ou de não prestar. Um jornal
estava dando uma página ou duas páginas inteiras em cima de algo que era considerado um tabu em
Alagoas e o texto era absolutamente simpático a ele. Eu não podia dizer ‘eu sou
macumbeiro’, mas ‘tava’ na entrelinha de que, se insistisse eu era [risos de ambos].
Aí
eles, os amigos macumbeiros, me procuram.
Quando eles me procuram já havia uma história minha com eles. Não me procuram
por acaso. Procuram ‘pra’ conversar sobre a perseguição que a Polícia ‘tava’
fazendo, segundo diziam e era mais do que possível. Especialmente eles diziam
que quando era a temporada da Salva de Exu, como eu falei. Não sei se existe
hoje ainda esse negócio de Salva de Exu. Existe? [Salva de Exu?][i].
Salva de Exu é um toque onde só baixa Exu. Aí você conhece tudo quanto é Exu. [Risos do Professor Sávio].
Eu
tenho umas amizades assim estranhas [Risos
do pesquisador], porque eu sei que se existirem eles estão aqui sentados
agora. Os Exus! Os Exus ‘tão’ aqui. Eu só ando com quem não presta. Tá tudo
aqui. [Risos de Jeamerson]. [Mas Exu presta][ii].
[Risos de ambos]. Eu falo que não
presta no sentido da moral tradicional. [Sim,
isso][iii].
[Risos de ambos]. Então deve ‘tá’
aqui assim ó! [Gesticula com a mão].
[Então, eles te abrem os caminhos, é?][iv] [Risos de ambos]. Eu tive uma briga com
o Tranca Rua. Esse foi um negócio sério na Salva de Exu. O peste queria que eu
tomasse uma cachaça. - Eu não tomo essa porra! Foi na Casa do Júlio, no
Terreiro do Júlio.
Aí
eles vieram conversar sobre a perseguição da Polícia. Aí me perguntam o que é
que eu achava. Eu digo: - Nós precisamos buscar um representante. [Professor Sávio imposta a voz]. Eu não
iria dizer isso, mas a chave era essa. Aí vão surgindo umas coisas: Tia
Marcelina surge daí. Ia surgindo umas coisas.
Era
qualquer coisa assim: ou sai da catacumba ou não existe vivo. Eu disse a você
que a vida da religião era muito ‘pra’ dentro, porque não tinha meio de dar um
passo desse. Isso contraria qualquer princípio de uma cabeça que não seja
absolutamente maluca. Porque seria se levantar contra toda a organização de
poder da sociedade, pegar isso, lançar-se na busca do público.
- O que é que
você acha, professor? Foi a pergunta.
Aí eu
disse: - Tem que ter um troço aí que
sacuda.
Queria
dizer, que não dava mais tempo ‘pra’ ir lentamente na construção dessa
representatividade. Ou papoca ou não papoca. E como é que papoca? Aí deu aquele
negócio: se papoca a gente faz.
O
sentido é que era esse. [Sim][v]. A
gente tem que dar uma tacada que aflore isso daí e que fique a Polícia de mãos
atadas, porque agora você não é mais marginal. Você tem que arranjar uma forma
de você penetrar de tal modo que a ideia de que você era marginal e vagabundo
não possa mais permanecer. E aí não pode ter a violência policial em cima. Eu
era doido, eu acho, sabe? [Risos de
Jeamerson]. Eu faria a mesma coisa hoje, eu faria. Só que hoje eu não tenho
mais a coragem de enfrentar. ‘Tô’ mais cansado... Me chamaram:
[Jeamersom: Mas sua memória já é uma ação
corajosa. [Risos de ambos]
- “E o que é que
o senhor quer fazer?”
- “Se vocês
toparem, eu queria dar uma porrada do caramba. A coisa que tem mais importante aqui em Maceió
‘pra’ gente atacar é o Teatro Deodoro.”
Por
que o Teatro Deodoro? Porque o Teatro Deodoro era símbolo e representativo da
cabeça da burguesia de Alagoas, embora ele fosse muito mais do que isso.
-
“Vamos fazer o seguinte, se vocês toparem. Vamos fazer uns toques...’
Repare
a proposta. Pense onde pesa a proposta. Mas eu não falei isso como de fora não.
Falei de dentro, porque eu era de dentro. [Sim.][vi].
Aí o cara diz: você era um intelectual!
Não é não. Eu era de dentro. Eu não falei de fora. Eu falei de dentro. E eles
vieram conversar comigo porque eu era de dentro.
Catedral
você não ia entrar. Eu não ia fazer um negócio desse na Catedral. [Risos de ambos]. Assassinavam a gente.
Era maluquice. Então eu tenho que ter um troço do estado, que pertence a todos.
- O que é que a
gente vai fazer?
- Vamos...
[i] Fala de Jeamersom.
[ii] Fala de Jeamersom.
[iii] Fala de Jeamersom.
[iv] Fala de Jeamersom.
[v] Fala de Jeamersom.
[vi] Fala de Jeamersom.
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