Casablanca and Communist beer.
Casablanca et communiste bière.
Casablanca y Comunista cerveza
Este texto foi originalmente publicado em Campus, suplemento do jornal O Dia, que circula semanalmente em Maceió. 24 a 30 de maio, ano 03, nº 0117, 2015
Plínio Lins, jornalista,
66 anos e 39 de profissão. Nasceu na Tijuca e se criou na Ilha do Governador.
Fugiu do Rio em 1970, na ditadura, porque sentiu aquilo que Gilberto Gil canta:
“amigos presos, amigos sumindo assim, pra nunca mais...”. Chegou em Maceió em
1973, pobre de marré, para conhecer a cidade. Gostou e foi ficando. Para
sobreviver, lavou carros, deu banho em cachorros, foi massagista de madame e
vendeu jazigos do Parque das Flores. Depois trabalhou como comprador em usina,
deu aulas e foi bancário da Caixa. No jornalismo, começou em 1976 na Rádio Novo
Nordeste, trabalhou na TV Gazeta, jornal
Gazeta em três ocasiões, Tribuna de Alagoas, O Diário e O Jornal, e fez fila em
semanários. Como colaborador voluntário e militante comunista, teve trabalhos
publicados nos jornais A Classe Operária, Tribuna Operária e na revista Princípios. Atualmente é assessor parlamentar no Senado.
Dois dedos de prosa
Casablanca foi um bar
que marcou época em Maceió e Campus teria que abordá-lo. Foi quando procuramos
o Marola, ex dono do bar e hoje da Marola Produções e Locações. Juntos lembramos do nome do Plínio Lins que
aceitou a encomenda e nos deu este belo texto.
Um pouco da vidada
boemia de esquerda aparece, nesta iniciativa singular de militantes do PCdoB, à
época.
Vamos agradecer ao
Plínio e ao Marola eu nos deu as fotografias.
Um abraço em ambos.
Luiz Sávio de Almeida
Bar Casablanca, 1989-1996: a cerveja comunista
O boteco de esquerda que tinha tudo para dar errado fez história na
vida cultural e política de Maceió
Plínio Lins
Foi um ano curioso, aquele de
1989. Talvez por ser o dos 100 anos da República. Ou porque o Botafogo foi
campeão carioca, e logo em cima do glorioso Flamengo (1 a 0 na final), ou por
outro motivo misterioso qualquer.
Para o autor destas lembranças, 1989
foi o ano do aniversário de 40 anos, e também da experiência fascinante de
viver e participar, em São Paulo, da primeira campanha eleitoral de presidente
da República depois da ditadura (Lula x Collor), trabalhando no comitê nacional
de Lula, em diversas ocasiões conversando pessoalmente com o candidato da
Frente Brasil Popular – a emocionante campanha do Lula-lá.
O ano de 1989 foi curioso
principalmente porque o país vivia o sufoco do final do governo Sarney. Mas a
reconquista da liberdade e a proximidade da eleição direta para presidente
animava as pessoas. Ainda mais em Alagoas: um dos candidatos era Fernando Collor,
apoiado pela maioria e combatido pela esquerda.
Pois foi em abril daquele curioso
1989, numa rua pacata do bairro da Ponta Verde, em Maceió, que seis amigos,
todos militantes do Partido Comunista do Brasil, o PCdoB, iniciaram a história
do primeiro bar de esquerda na cidade, o Casablanca.
O Casablanca já existia antes. Na
“fase comunista” durou de abril de 1989 a outubro de 1996. Uma criança de sete
anos e seis meses, mas vivida e experiente como um senhor de meia-idade.
O bar viveu nos governos de
quatro presidentes: Sarney, Collor, Itamar e FHC. Passou por três governadores (Moacir
Andrade, Geraldo Bulhões e Suruagy), além de quatro prefeitos de Maceió
(Guilherme Palmeira, João Sampaio e Pedro Vieira como tampões, e Ronaldo
Lessa).
Sem contar as mudanças de moeda
que se sucederam naquela inflação louca. De 1989 a 1996, pendurei minhas contas no Casablanca em cruzados
novos, em cruzeiros, em URVs e finalmente em reais. Coisas do milênio passado.
Eu era freguês do Casablanca desde
bem antes de ele ser comprado pelos seis amigos. Morava quase vizinho, na Rua
Campos Teixeira, uma transversal da Carlos Tenório, onde ficava o casarão de
dois andares que virou Casablanca.
A sucessão de gaúchos
O lugar abriu em 1983, com o nome
de Espaço Bar. O casarão foi comprado por uma família que viera de São Paulo. Seu
Gilberto revezava no balcão com o casal de filhos, Fernando e Fernanda, ambos
jornalistas recém-formados.
Em pouco tempo o Espaço Bar virou
febre. Era um local agradável, vivia cheio. A juventude lotava o Espaço todos
os dias.
O Espaço acabou em 1985 porque a
família viveu um drama. Fernanda, um doce de menina, foi raptada e estuprada. A
polícia nunca encontrou os criminosos. Nanda ficou traumatizada. Voltaram todos
para São Paulo.
Por um breve período o bar ficou
com um gaúcho que morava ali perto, Gercy Pires. Ele passou o ponto para um
casal também gaúcho: Gerda e Günter. Duas figuraças. Eles rebatizaram o bar:
nascia o Casablanca.
Gerda, simpatia gorducha, filha
de alemães, 40 e poucos anos e bonachona, cuidava de tudo: além de orientar os
cozinheiros e preparar ela própria alguns pratos, servia bebidas no balcão,
controlava os garçons e caixa, fechando as contas. Günter, alemão de raiz, vermelhão
e louro, só ficava no balcão tomando cerveja. Só saía dali para ir ao banheiro,
e conversava pouco, num português carregado de sotaque germânico.
Em 1987 o casal alemão voltou
para o sul. O Casablanca passou para outro gaúcho, Jorge, ex-dono do
Ipaneminha, barraca muito conhecida na praia ali perto.
Foi Jorge quem vendeu o
Casablanca para os seis comunistas em 1989.
E adivinhem quem foi o intermediário,
o facilitador, o corretor?
Pois é, eu mesmo.
Vitor, Cleo, Adelmo e Bolinho |
Os seis sócios: um
breve prontuário
Antes de prosseguir, vai aí um
resumo da vida pregressa dos seis elementos que adquiriram o Casablanca. Aliás,
cinco elementos e uma elementa.
Marola – Seu nome na certidão é Mário Vinícius Vilela, filho do
saudoso Mário Vilela e de Vânia, e irmão do também saudoso Beto, o Betola. Na
época Marola era conhecido como surfista, militante do PCdoB e come-quieto.
Dizia-se que Marola era uma prova de que o alagoano é um povo acolhedor e
hospitaleiro. Por exemplo, se uma turista solitária queria conhecer as coisas
de Alagoas, o pessoal apresentava a ela – nesta ordem – a carapeba frita, a
Barra de São Miguel, uma cachacinha de Joaquim Gomes (com mel) e o Marola. E
que nunca, jamais houve reclamação da parte de nenhuma turista. E que inclusive
algumas delas eram casadas e voltavam para casa muito alegrinhas e convencidas
de que Alagoas é mais, muito mais, e elas não se despediam com adeus, era até o
ano que vem. Quer dizer, o trabalho de promoção turística era sério e
funcionava. No início dos anos 90 Marola casou com Leidijane, nasceu o João
Victor e o predador sossegou o facho – pelo menos é o que consta.
Victor Palmeira – Era diretor da UNE, militante dedicado, grande
figura, membro da família política mais diversificada de Alagoas (ali tem
liberal, tem direitista, centrista, tem petista, comunista, e se surgir alguma
outra corrente ideológica, haverá um Palmeira no meio; o clã é democrático).
Flamenguista e regatiano, Victor, na vida mundana, revezava com Marola na dura
faina de endoidar mulher. Recrutou muitas militantes para o PCdoB com
argumentos políticos e, quando esses não eram suficientes, como ele dizia
modestamente, “aí o argumento era o zépinto, mas só em último caso” – e havia
quem acreditasse nessa alegação. Hoje Victor está casado e mora em Brasília.
Trabalha com o ministro Aldo Rebelo.
Bolinho – Lúcio Antônio Vieira da Rocha, eis o nome de batismo do
sujeito. O apelido vem de tempos imemoriais, sabe-se lá por quê. Homem sério,
pau pra toda obra, criado com leite de jega preta. Torcedor do Flamengo e do CSA.
Médico laboratorista, tinha dois filhos pequenos, Lula e Victor, com a mulher,
Sandra, bancária da Caixa e dona da gargalhada mais rasgada de Alagoas, quiçá
do Nordeste. No período do Casablanca, Sandra engravidou. Eram gêmeos! Bolinho
se apavorou. De repente a ninhada dobrava de tamanho, tinha que comprar outro
enxoval. Meses depois chegaram o Vinícius, hoje jornalista, e a Liara. Está
tudo certo.
Solange Viégas – Economista, esposa do boa-praça Osvaldo Viégas, Solange
entrou para a sociedade vendendo o carro e acabou ficando só no primeiro ano.
Tinha dois filhos para cuidar, pequenos na época, e o rojão de ficar atrás do
balcão até tarde da noite nos seus plantões ficou pesado demais. Frequentou o
bar até o fim.
Cléo – Cleonilson Alves da Silva, economista, Flamengo e CRB. Sou
suspeito para falar nele. Além de amigo antigo e querido, é compadre em dobro:
batizou meu filho número três (tenho seis) e foi padrinho do meu segundo
casamento. Cozinheiro de mão cheia, não tinha capital como os cinco sócios para
ajudar na “vaquinha” e comprar o Casablanca e entrou com o talento culinário e
o trabalho. Tem prazer em receber as pessoas em casa. Há poucos como ele.
Trabalha na área cultural do Estado.
Magadelmo – O nome de pia é Adelmo Mota Mendonça. Vascaíno,
coitado, e CRB. Economista, trabalhou no Planejamento, bom analista e formulador
de políticas públicas, uma opinião ouvida com atenção. Além disso, é um dos
papos mais animados de Maceió. Se um pinguço encostasse no balcão do Casablanca
querendo palestrar, não ficava falando sozinho. Com Magadelmo a conversa nunca
morre, ele sempre tem assunto para esticar. E não é qualquer assuntinho não! Só
digo uma coisa: Adelmo Mota Mendonça escapou de dois acidentes com avião. Não
um: dois. Aposentou-se mas é fominha de bola e ainda joga seus rachas.
O PCdoB, as eleições e
os Meninos da Albânia
Em 1989, o PCdoB ainda era a
legenda mais importante na esquerda em Alagoas. O partido estava legalizado
desde a Constituinte de 88 e tinha em seus quadros lideranças políticas,
sociais e populares reconhecidas, principalmente em sindicatos e no movimento
estudantil, além de presença respeitada em círculos intelectuais de Alagoas.
Desde bem antes, em 1982, o
PCdoB, ainda na clandestinidade e abrigado sob o guarda-chuva do PMDB, havia
elegido seu primeiro deputado estadual, Eduardo Bomfim, e dois vereadores em
Maceió, Edberto Ticianeli e Jarede Viana.
Em 1985, na primeira eleição para
prefeito nas capitais, o PCdoB apoiou a candidatura do então presidente
estadual do PMDB, deputado federal Djalma Falcão.
A militância do PCdoB, numerosa,
organizada e aguerrida, foi para as ruas, organizou a boca-de-urna e
virtualmente garantiu a eleição de Djalma – que lamentavelmente estragou tudo,
fazendo uma das mais desastradas administrações da história da capital alagoana.
Felizmente para a cidade, Djalma só ficou três anos no poder.
Para o PCdoB, a campanha de
Djalma acabou resultando, vejam só, na criação de um bloco de carnaval, os
Meninos da Albânia. Ele desfilou pela primeira vez em 1986 e ajudou a trazer de
volta o carnaval de rua e a sátira política em Maceió.
O nome do bloco, Meninos da
Albânia, era como Edécio Lopes, locutor da propaganda eleitoral do PDS, partido
da ditadura, referia-se de forma jocosa aos jovens militantes comunistas da
campanha de Djalma Falcão. Com a vitória, nós, do PCdoB, achamos que o apelido da
campanha podia batizar um bloco de carnaval. E assim foi feito. O próprio
Edécio, grande incentivador do carnaval de rua, ao anunciar o novo bloco em seu
programa no rádio, gostou da ideia, deu parabéns aos comunistas pela solução
bem-humorada e concordou em ser “padrinho de batismo” do bloco, com muita honra
para nós.
Eu fui escolhido presidente dos
Meninos da Albânia – pelos estatutos, a exemplo da “matriz”, o mandato era
limitado em 45 anos, com direito a apenas uma reeleição, para garantir a alternância
no poder...
Eu era o presidente mas o bloco
era parlamentarista, de maneira que o presidente não mandava nada.
Conto essa história porque o
Casablanca, em sua fase de esquerda, tornou-se o local da “concentração” dos
Meninos da Albânia antes dos desfiles. Ali no bar eram compostos os frevos do
bloco, criados e cantados por Ricardo Mota, na época militante do partido.
Procura-se um bar
Em 1986, o PCdoB elegeu Eduardo
Bomfim deputado federal Constituinte. Em 88, na eleição municipal, o jornalista
Ênio Lins foi eleito vereador de Maceió.
Tudo muito bom, o partido vai muito
bem, mas e nós, os boêmios comunistas? Nós continuávamos errantes, sem um bar para
chamar de nosso. E éramos exigentes. Nesse bar aqui a comida é boa mas a
cerveja é morna. Aquele ali não tem um tira-gosto que preste. Aquele outro é
bom mas fica longe. E assim éramos beberrões nômades.
E então algum dos seis –
certamente embriagado, ou quase – teve a ideia de jerico: por que a gente não
faz um bar nosso, ao nosso gosto?
Perguntaram minha opinião, eu
falei no Casablanca e suas paredes com fotos do Humphrey Bogart e da Ingrid
Bergman, a suave canção As Times Goes By, a imensa amendoeira que dava sombra
até o lado de lá da rua. Os seis gostaram, alguns já conheciam.
Pediram que eu sondasse o Jorge
sobre venda e preço, sem dizer que queriam comprar.
Era março de 1989, fim da
temporada de verão. Uma noite, o Jorge já fechando o bar, perguntei se a
temporada havia sido boa. Ótima, disse ele, ganhei um bom dinheiro.
– Então você nem pensa em vender,
né?
– Quero vender, sim – disse ele,
e eu disfarcei minha surpresa. – Estamos mudando para Lisboa, minha filha vai
estudar lá.
– Já tem proposta, tem comprador?
– perguntei.
–
Não. Até agora não achei quem queira fazer negócio.
Silêncio.
Depois ele parou de fazer o que
fazia, chegou mais perto e disse:
– Eu vendo por (e disse o preço).
Por menos que isso não dá. Se você arrumar um comprador, eu te pago 5% de
comissão.
Era uma boa grana.
O preço estava mais ou menos
dentro da previsão dos seis comunistas.
– Vou procurar. Se achar alguém
interessado eu lhe falo.
Contei a conversa aos seis,
inclusive a parte em que o Jorge ofereceu a comissão. Ficou acertado que a
comissão voltaria para eles.
E assim foi feito. Jorge não
sabia que eles eram meus amigos e queriam um bar.
O negócio foi fechado. Eu sou
testemunha: os seis na minha casa contando, nota por nota, todas as suas
economias. Cada um tratou de arrumar o que podia, sem mexer nos salários, porque
todos tinham família para sustentar. Venderam carros, terrenos e tudo que podia
ser vendido, alguns pegaram grana emprestada, até que a vaquinha chegou ao
valor da compra. Zeraram as contas bancárias, esvaziaram os bolsos, rasparam os
cofres, tudo.
Depois de pagar ao Jorge e
assinar o contrato, os seis estavam completamente lisos. Eram afinal donos de
um bar, com mesas, geladeiras, fogões, panelas, pratos, talheres e todo o
resto, inclusive engradados de bebida com garrafas vazias – só não tinham o que
gelar, nada para cozinhar nem para servir aos fregueses.
Ficou acertado que no dia
seguinte eu iria ao bar, na qualidade de corretor, pegar as chaves para
entregar aos compradores. Sim, e receber minha comissão.
Na hora marcada eu estava lá.
Recebi o cheque e corri para casa.
Os seis estavam lá, escondidos e
aguardando ansiosos. Cheguei com o cheque e nem pudemos comemorar – aquele
dinheiro tinha destino certo.
Um dos sócios, não me lembro
qual, falou em nome dos seis:
– Você vai beber de graça durante
um ano.
Fiz ver a eles que aquilo era uma
temeridade, tanto para as finanças deles como para meu pobre fígado. Mas a
decisão estava tomada.
A esquerda sob a
amendoeira
O Casablanca, sob nova
administração, abriu as portas numa quinta-feira, 13 de abril de 1949. Meu
aniversário de 40 anos. Não foi homenagem a mim, nem precisava. É que o pessoal
precisava fazer dinheiro o quanto antes, porque já estava contando o prazo do
aluguel.
A sombra generosa da amendoeira
abrigou, naqueles sete anos e meio, todas as emoções, bobagens e delícias da
convivência humana que só mesmo um bar proporciona. Com a diferença de que ali
uma parte importante do mundo político de Alagoas tinha refúgio seguro para
discutir, salvar o mundo ou simplesmente jogar conversa fora.
O Casablanca “sob domínio
comunista” nunca foi propriamente um empreendimento comercial, muito menos um
bom negócio. Foi uma ideia para juntar pessoas conhecidas.
Como negócio, aquilo não podia
dar certo. Aliás, tinha tudo para ser um desastre.
Onde já se viu um bar com seis
sócios? Com três economistas na sociedade? Com um surfista come-quieto, um
líder estudantil e um médico? Um bar em que apenas um dos sócios sabia e
gostava de cozinhar?
Um bar em que, dos seis sócios,
cinco eram eméritos bebedores?
Com a honrosa exceção de Solange
Viégas, os outros – Magadelmo, Cléo, Marola, Bolinho e Victor – eram valentes
no copo.
Antes do Casablanca, eles bebiam
o equivalente a uma piscina de cerveja. No Casablanca, bebiam uma piscina
olímpica.
Os cinco eram os maiores fregueses
do bar.
Não podia dar certo. Mas deu,
seja lá como for.
O bar resistiu, de pé e com
dignidade, durante sete anos e seis meses. Tornou-se conhecido em toda Maceió.
A Conversa de Botequim
De 1990 até o fim, nas noites de
quinta-feira, mais ou menos das 11 horas até o rabo da madrugada, acontecia no
Casablanca a Conversa de Botequim, ideia do Victor, que eu apresentava.
Um pequeno palco na varanda, uma
mesa e duas cadeiras. Eu e o entrevistado, cada um com um microfone,
conversávamos. O público também podia
fazer perguntas por escrito, entregues aos garçons, que levavam para mim.
Na estreia, o entrevistado foi
Cristovam Buarque, ex-reitor da UnB, depois governador do Distrito Federal pelo
PT e atual senador pelo PDT.
Depois passaram pela Conversa de
Botequim governadores, prefeitos, deputados, senadores, até ministros que
vinham a Alagoas, gente das artes e do esporte, empresários, personalidades,
figuras marcantes. A cidade comentava, a imprensa cobria. Não sei quantas
pessoas entrevistei. Sei que tinha prazer em fazer aquilo, como jornalista e
boêmio.
Uma das entrevistas, talvez a
melhor de todas, foi com um personagem que virou lenda viva, Benedito Alves da
Silva, o Mossoró, dono do puteiro mais conhecido de Alagoas. Bem-humorado, Mossoró
contou para o Casablanca lotado, até a madrugada, casos de sua vida que haviam
virado folclore, como a história das putas na Fênix, a do Galaxie e muitas
mais. Entornou meio litro de uísque, e eu na vodca. Havia até ministro de
tribunal superior que veio de Brasília para ouvir e abraçar Benedito Mossoró.
Grande noitada.
Houve muitas outras, memoráveis.
Ficam para outro relato. As duas últimas entrevistas, em outubro de 1996, foram
com a cantora Leureny Barbosa e, na despedida, o então prefeito de Maceió,
Ronaldo Lessa.
Solange Viégas havia saído da
sociedade depois do primeiro ano. De 1990 até 1993, os outros cinco
continuaram. Os últimos três anos do Casablanca, até 1996, foram só com Marola
e Leidjane no comando.
O corno e o pé-de-pano
O bar fechou, mas não por desistência.
Foi porque Seu Gilberto, de São Paulo, exigiu a devolução do prédio para
negociar. Marola adiou a entrega o quanto pôde, até a ameaça de despejo. Aí
entregou. Acabou-se o Casablanca. E nasceu o Movimento dos Sem-Bar, que éramos
nós.
Um detalhe curioso: nunca houve
uma briga no Casablanca comunista. Houve um episódio que, como outros, acabou
em gargalhada. Foi o caso do pé-de-pano que pensou que um corno vinha entrando
para matá-lo, saiu correndo pelo bar adentro, pulou o muro dos fundos, se
cortou todo nos cacos de vidro – e o corno, inocente, tinha só um jornal
enrolado na mão...
O mais triste no fim do
Casablanca – no ano que vem faz 20 anos – foi a primeira providência dos novos donos. Derrubaram
a amendoeira.
Sinto saudade de tudo o que houve
ali, das conversas, das entrevistas, das bebedeiras. Mas a lembrança mais viva,
até hoje, é da velha amendoeira.
passei boas noitadas com meu amigo luis pompe na viola mandando ver protesto pra todo lado e no final dos cascos vazios, cada garrafa era um alvo das tampinhas representando a direita, todos de porre e fechados na luta.
ResponderExcluir