Saímos sem maior compromisso do que entrar no trem e chegar onde
possível. Terminada a viagem, eu pedi para escreverem assim que chegassem casa,
as impressões que teriam ficado; eram apreensões em bruto que posteriormente
seriam trabalhadas. Pedi para que a redação fosse o mais bruto possível.
Resolvi trazer a
público o que escreveram de forma bruta; grande parte de Maceió teria espanto
semelhante, ao ver-se no sacolejo de um trem.
Quero agradecer à
CBTU pela forma que nos tratou; um modo simples, digno e seguro.
Vamos ver as impressões que ficaram; alguns
dizem que a primeira impressão é tudo.
Pegue o VLT ou o trem e veja qual sua
impressão. Abraçamos todos os trabalhadores que se empenham, em fazer funcionar
o sistema em Maceió.
Um abraço.
Sávio de Almeida
O trem de Maceió
Airton Rocha Omena Júnior
Sempre que visito uma
estrutura histórica fico imaginando quantos olhares, pensamentos, felicidades e
tragédias já percorreram o lugar, os mesmos caminhos seguindo um fluxo, o
movimento e os espaços que, mesmo modificados pelo tempo, carregam traços do
que já foi, impressões digitais gastas.
Ao entrar no edifício da CBTU de Maceió o estado de
contemplação tem início, o prédio sustenta em suas paredes anos de história e
se mantem vivo pelos que continuam a percorrer hoje os mesmos caminhos forjados
em madeira e metal encravados no tecido da cidade a mais de 80 anos.
Pela rota do trilho vemos o “rosto” que a cidade mostra,
fachadas gastas reformuladas por letreiros modernos de estética duvidosa,
outras destruídas pela ação do tempo e do vandalismo, outras ainda se erguem
conservadas ao que parece conseguir manter sua estrutura e suas esquadrias em
madeira, tortas, desalinhadas por não resistir a umidade e a gravidade. O tempo
não perdoa nada e tudo marca a passagem dos dias.
Do Centro à Bebedouro a paisagem urbana prevalece, tesouros
de arquitetura histórica se misturam as novas edificações mais funcionalistas e
sem adornos, erguidas da necessidade e não para exposição. A feira do mercado
fervilha; comércio, movimento e cheiros dão sentido de existir a uma área da
cidade que a tempo não recebe o cuidado que merece. Passando as áreas do
Mutange e Bebedouro a paisagem muda e em meio as edificações aparecem trechos
verdes, grandes árvores e vegetação de margem da Lagoa surge para quem está nos
vagões.
O trajeto segue no sentido Satuba com cada vez mais natureza,
dá a impressão de estar lá a vida toda, todo o tempo, majestosa resistindo por
sorte a ocupação desenfreada do homem sobre o território. Bebedouro, Fernão
Velho, Goiabeira... se não apresentassem pontos de ocupação quase miseráveis,
se constituiria numa paisagem idílica, mais uma entre as infinitas que esta
Cidade oferece aos que se dispõem a perceber.
Observar os passageiros que seguem viagem é atração à parte,
idosos, adolescentes, crianças e adultos seguem quase que diariamente o
percurso do trem já incorporado a suas rotinas. Estudantes, trabalhadores,
compradores de feira, que para o caso do VLT tem de levar seus produtos bem
vedados para não impregnar o ar dos vagões fechados, ou qualquer outra
modalidade de passageiro entre as infinitas variáveis do cotidiano, tornam o
espaço do trem num local democrático e seguro.
Esta experiência me mostrou como Maceió é carente de um transporte
de massa eficiente e que barato, o valor da passagem custa 0,50R$ (cinquenta
centavos), que permita este contato efêmero, nos lembrando que a cidade é feita
de um conjunto social e não de células independentes. Numa constatação mais
ampla, hoje esperei registrar paisagens, relatos, rostos e histórias, mas agora
vejo que minha maior constatação neste trajeto foi o sentido de humanidade, de pertencimento, de conjunto - o sentido da vida urbana.
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