Poliana Belo: 24 anos,
estudante de Ciência da Computação na UFAL, militante do Movimento Mulheres em
Luta e do PSTU
La violence contre les femmes et question de classe
La violencia contra las mujeres y cuestión de clase
Violence against women and the class issue
La violencia contra las mujeres y cuestión de clase
Violence against women and the class issue
Não é preciso
refletir muito para apontar diferentes problemas presentes na sociedade. Muitos
são os eventos do dia a dia que comprovam as grandes contradições existentes no
mundo. Algumas aparecem na televisão, outras nem tanto, mas a civilização moderna
apresentase em um modelo de sociedade doente e que sempre apresenta os seus
sintomas. O machismo é parte disso. O tratamento da mulher enquanto ser inferior
ao homem, inclusive como propriedade dele, é uma das expressões inerentes da
atual sociedade. Existe quem negue, diga que a mulher e o homem são tratados igualmente,
mas o machismo existe e não faltam dados para comprovar este diagnóstico. É um
problema que se expressa de diferentes maneiras.
Uma das faces
mais cruéis, e também muito comum dessa forma de opressão, é a violência contra
a mulher. Violência física, psicológica e sexual, são muitas as formas de
afetar, profundamente, as vidas de todas as mulheres, principalmente das negras
e da periferia, que são as principais vítimas de tais atrocidades.
Combater o machismo
vem sendo, cada vez mais, parte da preocupação de muitas mulheres. Seja através
dos movimentos sociais, da arte, ou a partir de reações cotidianas, são
inúmeras as expressões da resistência feminina. Apesar de, muitas vezes, a
mulher ser silenciada, por causa do medo e das fortes pressões que ela sofre,
não são raras as situações em que ela responde e encontra apoio. Em meio a este
cenário, repleto de opressão, o feminismo vem ganhando visibilidade e se
afirmando enquanto ferramenta para conscientizar e lutar contra a opressão
machista.
Apesar deste
debate e da reivindicação desta ferramenta serem mais restritos aos setores
mais favorecidos economicamente, há muito tempo não se viam reações como as
mais recentes em resposta aos ataques contra as mulheres. E a luta feminista
faz exatamente isso, faz com que a sociedade questione a cultura do estupro,
exija a queda de governantes machistas, discuta o assédio no local de trabalho,
e por aí vai, exigindo a igualdade plena de direitos entre mulheres e homens. É
a luta que surge para querer emancipar as mulheres das fortes correntes
ideológicas e morais que as prendem. É querer acabar com uma ideia opressora que
causa consequências nefastas a toda humanidade.
É normal o ser
humano, ao se deparar com um problema, tentar resolvê-lo atacando seus aspectos
mais imediatos. É comum, e também importante, combater o machismo exigindo mais
investimento em políticas públicas de combate à violência contra a mulher,
exigindo uma educação que tenha o debate de respeito perante as diferenças,
realizando manifestações e debates sobre estupro. Tais mobilizações são
fundamentais para o movimento feminista e são elas que, de certa forma,
contribuem para amenizar aspectos da opressão que as mulheres sofrem
cotidianamente.
Porém, por mais
que se corte as ramificações deste problema e se consiga amenizar alguns
impactos do machismo, devese entender que esses aspectos não acabam com ele. A
luta feminista precisa ser enxergada não só por suas pautas mais evidentes e
visíveis no movimento, mas também pelos seus aspectos mais profundos. Se se
pretende encerrar um problema de verdade, conseguir cortar o mal pela raiz e
alcançar o seu fim, precisamos olhar de forma mais global para ele, inclusive buscando sobre sua origem.
É necessário
compreender que o machismo é antigo, porém nem sempre existiu. Nem sempre a sociedade
foi assim, com a mulher colocada para assumir papéis por causa do seu gênero,
enquanto figura do lar, mero objeto de reprodução e com capacidade inferior à do
homem. Nem sempre o homem, principalmente heterossexual e branco, foi o centro
das famílias e da sociedade. Nem sempre as famílias, hoje monogâmicas, tiveram
este formato e composição. É fundamental reconhecer que moldar o homem e a
mulher desta forma foi elemento necessário para a construção e sustentação do
modelo de sociedade vigente. O machismo, que vem com o patriarcado, não surge
enquanto elemento isolado e repentino da história. Tais transformações, das
relações sociais e dos núcleos familiares, também não aconteceram impulsionadas
por fatores naturais, mas sim econômicos.
O
desenvolvimento das forças produtivas para gerar os meios necessários para a
sobrevivência humana, possibilitaram uma maior produção de bens para todos, mas
também permitiu o acúmulo destes nas mãos de pequenos grupos. Possibilitou que
a propriedade, que antes era coletiva, viesse a ser individual e concentrada para
o uso de poucos, transformou os bens comuns em propriedade privada. Propriedade
esta que possibilitou o acúmulo de riquezas nas mãos de uma ínfima minoria, que
enriquece e lucra, cada vez mais, em cima da opressão e exploração da maioria.
Pois, aqueles que não são donos das ferramentas e dos meios de produção que
antes eram um bem comum, devem vender seu trabalho para garantir o seu sustento,
permitindo que tudo aquilo produzido por ele e construído com seu suor,
pertença a um pequeno grupo.
Dentro disto, a necessidade de
transferir essas riquezas acumuladas ao longo do tempo aos seus parentes e
filhos legítimos, ou seja, a herança, só se tornou possível através do
aprisionamento e confinamento da mulher. Para garantir a herança e a
perpetuação da propriedade privada foi necessário disseminar a ideia da mulher
enquanto propriedade do homem, e para tal surge a ideologia machista. O surgimento
do machismo e a transição ao patriarcado foram fundamentais para garantir o
triunfo da propriedade individual sobre a propriedade coletiva.
O machismo faz
parte da essência do surgimento da propriedade privada e da sociedade dividida
em classes. Sociedade em que se busca, antes de tudo, o favorecimento do indivíduo
no lugar da coletividade. É uma opressão necessária para garantir a
sobrevivência de um mundo cheio de injustiças. E o classismo cumpre a
fundamental tarefa de ligar a luta pela emancipação da mulher a luta pela emancipação
de todos os oprimidos. O feminismo classista coloca a necessidade de não só confrontar
o machismo, mas também a sociedade dividida em classes e o patriarcado,
evidenciando a mulher trabalhadora enquanto esmagada não só pela questão do gênero,
mas também pela exploração do trabalho. Enquanto houver capitalismo não será
possível acabar com a inferiorização da mulher e qualquer outra forma de opressão
que servem como pilares desta sociedade que se apropria de nossas diferenças e
as transforma em sinônimos de inferioridade.
Este artigo foi publicado em Campus/O Dia. Maceió
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