A poesia escondida no barro da grota
Luiz
Sávio de Almeida
A Grota da Alegria fica nos
caminhos do Benedito Bentes (II); cheguei a pensar que por lá passava o Riacho
da Caveira, um lugar em que sempre fui tomar banho e que perdi seu rumo no
universo das construções que se fizeram. Aquela paisagem mudou muito, já não se
identifica mais onde era a estrada das Duas Bocas, a estrada do Contrabando e
do próprio Riacho da Caveira. O espaço foi mudando e dando adeus ao tabuleiro
dos riachos, onde existiram conhecidos banhos. O que era barro foi virando
asfalto e o que era riacho foi virando esgoto.
Lendo as crônicas escritas
pelo Djalma de Araújo sente-se a natureza das mudanças e do que vem
acontecendo, sendo de se pensar quanto ao fenômeno de desperiferiação que se vai procedendo nos lados do Benedito Bentes,
levando-o a perguntar onde e como se poderia ver a peirferia. O interessante é que ele partilhará conosco
este mundo e e por mais pesado que seja o texto, nota-se que não há desespero,
que a esperança continua vivendo.
A gente vê a cidade
escondida, em sua vida; a narrativa sobre o pai espancando o filho é terrível,
como se fosse um mundo que você demora a acreditar que exista e tudo dentro de
uma forma objetiva de narrar, enfatizar. Djalma é um escritor que se preocupa
com os seus, um escritor que tem a sua gente, que se identifica com ela e
requer, como cidadão, que seja respeitada. Eu fico pensando, com meus botões,
sobre quantos Djalmas existem por aí, com seus escritos maciamente guardados,
sem possibilidade de serem publicados?
Não somente os doutores e
associados da classe média produzem: são inúmeros os artistas que existem,
teimando em subsistir em toda a composição da pobreza alagoana, indo do urbano,
por exemplo, do reggae e do ripiropi, ao modo mais tradicional que se nota em
Djalma embora fale da mesma cidade. É hora de alguém se interessar por
sistematizar os registros desta produção e os disponibilizar.
Precisamos aprender com os
escritores sobre a nossa cidade, entender que a periferia é uma grande
produtora de conhecimento e de arte, dialogar com ela para que a nossa
circunstância urbana fique mais aclarada e o dialogo se amplie. Eu me
comprometo com Djalma a publicar sistematicamente as suas crônicas sobre a
Grota da Alegria e seus textos serão lidos em minha sala de aula. Já vou
incluir na bibliografia do próximo ano. É que todos estes textos são de
altíssima erudição e carregam muito de perto a construção da cultura e da vida
e expressam singularmente o modo de ser da vida urbana que é sentida pelos
empobrecidos pelo sistema.
Certa feita e com dois
alunos, conversamos com os moradores de
rua; o material, em parte, foi publicado em Contexto, suplemento que
mantínhamos na Tribuna de Alagoas e similar ao Campus. Eles eram estimulados a
falar sobre a relação com o estado; desejávamos saber como o estado chegava a
eles e vimos que eles destacavam partes
do estado, as únicas que encontravam:
segurança e saúde. Barbaridade, as falas eram drásticas e tenho quase absoluta
certeza de que o mesmo fluirá para o comum das grotas.
Não estamos a falar somente
da falta de presença do estado, a sua ausência conforme se costuma mencionar. O
grande problema e bem mais significativo no cotidiano, é a forma como chega ou
a forma como a população sente que ele chega. É o modo como ele aparece e lida
com as expectativas e direitos constitucionais do cidadão que foi engrotado.
Mais perversa do que a falta, é o modo como faz sentir a presença.
Quando forem ler os textos do
Djalma, procurem ver como estas coisas estão sublinhadas e como a impotência
leva ao desespero como foi o caso do do Seu Williams, um caso triste em que um
pai vinga no filho, a falência de expectativa de vida que sempre teve.
Nenhum comentário:
Postar um comentário