O
maravilhoso das ruas que se encantam na memória. Rua da Penha em Penedo,
Alagoas
Luiz
Sávio de Almeida
A minha geografia pessoal de Penedo tem de ser absolutamente
diferente da geografia de outras pessoas, na medida em que ela existe
recordando e atribuindo sentimentos e significados. Os lugares são marcos de
vida e busca-los no passado, além de ser um exercício maravilhoso, é uma
procura de sentido de vida. Neste entendimento desta geografia que atribui
significações pessoais a lugares, a gente toma posse de um pedaço da cidade. Assim,
a Rua da Penha é uma multiplicidade de situações e de circunstâncias que somente a consegue
inventar e reinventar quem a viveu de uma determinada forma e modo. Eu a vivi
ainda usando tamanco de madeira, uma indicação mais distante de tempo que
consigo para ela e sua intensidade localiza-se em um pequeno pedaço que vai do
Gabino Besouro até o Beco da Preguiça; para cima, em direção à Praça, ela não é
propriamente a minha rua, sendo rarefeita e apenas lembrada em situações particulares
como almas e passarinhos. Seu limite para quem sobe – e à direita – é a bodega do Seu Cazuza e, pela esquerda, a
imponência do Beco da Preguiça, aquela ligação com a Rosário Estreita, conforme
se dizia por existir a Rosário Larga.
Este é o universo privilegiado de minha Cidade de Penedo, um
quase nada dentro daquele território urbano cheio de sobrados e belissimamente
repassado por Caroatá, pelo idos do último quarto do século XIX. Por ali, existe um tempo enganchado e que é o
tempo de minha infância e talvez por isto, eu jamais consiga esquece-la e a carrego em mim; vezes ela está quieta e
vezes algo a futuca e então ela volta de alguma forma. E o interessante é que as
pessoas das quais me recordo, não aparecem destacadas das relações que tiveram
comigo, talvez querendo indicar que são mais eu-mesmo do que elas. É como se eu
as utilizasse para lembrar-me de mim e como se fosse impossível ao tempo fugir
da marcação das individualidades. Daí, a
mesma rua serem muitas.
Nela, eu tenho o meu próprio patrimônio histórico e recheado,
inclusive, de monumentos. Posso dizê-los:
são poucos e basta descer a rua e eles aparecem; subindo, eles não existem,
salvo no que vou chamar de minha primeira Penedo. A minha primeira Penedo foi demarcada pelo
Cajueiro Grande; a Rua da Penha é a minha segunda Penedo. Apois, o primeiro monumento histórico era a
Bodega do Seu Cazuza, depois a casa da Dona América, onde morou, também, depois
que Dona América ficou viúva, Dona
Virgínia e Seu Pontes, e vai que aparece a casa de Seu Joãozinho; em seguida a
de uma menina de quem não lembro o nome
e a quem jamais esqueci, parecendo que a mãe era costureira e vinda da Ilha das
Flores. Finalmente, a casa do pai da Dona América e a majestosa Igreja da Penha.
Depois – e muito depois, depois mesmo – vinha a casa onde vi o defunto e já
estamos vizinhos ao Grupo Escolar Gabino Besouro, ponto de entrada em minha Penha
e menos importante do que os pontos de saída que eram a bodega de seu Cazuza e o Beco da Preguiça.
Era uma rua poética? Posso dizer que sim; jamais a recordo
sentindo algum pesar, algum peso puxando de banda e quem sabe se é exatamente
por isto, que a seguro em mim como se fosse um saboroso sapoti? Ela virou poesia e tenho a clara sensação,
agora, de que as ruas são escritas, textos e como tal devem ser lidas. Eu sempre aprendi muito com meu pai e com
minha mãe; eram dois aprendizados distintos; com minha mãe eram mais dicas
humanas. Uma vez eu estava com um problema sério e fui conversar com ela.
Depois de me ouvir, veio a sugestão: “Meu filho, talvez você precise ser feliz
com o que é possível!”. Acho que a minha Rua da Penha foi uma das minhas
possibilidades.
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